Roberto Santiago
Vice-presidente da UGT e presidente da FEMACO
19/11/2016
A conjuntura política atual brasileira pode ser caracterizada como “um processo de transição”, e não apenas uma simples substituição da Presidente por seu Vice-Presidente.
Ainda que membros de uma mesma aliança, que gerou a chapa vencedora em 2014, Dilma Roussef e Michel Temer são personagens que adotaram perspectivas teóricas e práticas diferenciadas ideologicamente. Michel Temer, mais do que um presidente substituto, representa uma guinada algo radical nos paradigmas adotados para orientar as políticas públicas, daqui por diante. Temer representa, em termos figurativos, um movimento pendular: da grande centralização estatal, acompanhada por um laxismo fiscal, para um modelo que exige mais participação dos atores políticos, sociais e econômicos na definição dos programas públicos.
Em verdade, o atual governo adotou orientações fiscalistas, de expressão extrema, provenientes das recomendações do FMI, desde 2013/14, quando eclodiu a crise fiscal na Grécia, Espanha e outros países europeus que viram seu déficit operacional explodir as Contas Nacionais. Com é usual, nestas circunstâncias, o FMI supõe que o controle dos gastos públicos será uma medida necessária para – além de objetivamente diminuir o déficit público – restabelecer a confiança dos investidores, fortalecer um marco jurídico de respeito aos contratos e fazer um aceno às novas fronteiras do investimento produtivo, principalmente em infraestrutura, uma dimensão carente no panorama econômico mundial, sem exceções.
Uma questão altamente polêmica, na perspectiva do FMI, é que o controle do déficit público abrange, prioritariamente, a necessidade de redefinir os direitos sociais, o regime de tributações e a chamada à co-participação do capital privado nos programas de investimentos básicos. Isso significa inverter as direções da política social e econômica do Brasil, por exemplo, dos últimos 13 anos.
De outro lado, a atual administração federal, apesar da adesão à ortodoxia recomendada pelo FMI, apresenta sinais de indeterminação e falta de hegemonia no interior do governo para a implementação desse e de qualquer outro projeto estatal. Isso é devido a muitos fatores: a natureza do sistema partidário, multifacetado e sem identidade ideológica e programática mais definida; a natureza do impedimento de Dilma Roussef, baseado na condenação das “pedaladas fiscais”, abrindo um precedente procedimental que alerta e assusta os atuais dirigentes, eventualmente passíveis das mesmas fatais acusações; a falta de amplo debate nacional entre as forças sociais do país sobre as alternativas possíveis frente ao déficit governamental; bem como a natureza da composição ministerial, agora amplamente marcada pelo conjunto de forças que controlam o Congresso Nacional.
Nesse quadro, são muitas as indefinições sobre políticas públicas e são muitos e diversos os interlocutores habilitados para o encaminhamento de decisões governamentais. Trata-se, pois, de um processo de transição marcado por diferenças ante a conjuntura anterior (Dilma I e II), em várias dimensões.
A indefinição ou o “empate político” habitando o centro do poder, exige – mais do que nunca – a pressão das forças sociais vivas na sociedade brasileira, o protagonismo extra-parlamentar e a proposição de medidas exequíveis que não sejam regressivas frente às conquistas sociais e trabalhistas das últimas décadas.
Nesse sentido, todo o protagonismo de forças sociais e suas organizações (sindicatos, movimentos etc.) que possa ser exercido, é altamente recomendável. Não podemos esperar que o Congresso Nacional seja o único palco onde se desenrola esta etapa crucial da vida nacional. Além das ruas, além da imprensa, é preciso que toda e qualquer possibilidade de acesso e diálogo com os dirigentes do Estado seja aproveitada e sirva de marcador para o avanço da pressão que busca resistir à mudança prejudicial aos direitos já conquistados.
O presidente da UGT, Ricardo Patah, em encontro recente com o Presidente Michel Temer, simplesmente ratificou as posições que unem a própria União Geral dos Trabalhadores e a própria plataforma comum de lutas das demais Centrais Sindicais brasileiras ao redor dos intocáveis direitos dos trabalhadores. Que as reformas se façam alcançando os sonegadores, os devedores da Receita Federal, redefinindo os privilégios dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), e principalmente se redefinindo os critérios que sustentam os mais altos juros do planeta em função de uma dívida pública crescente que só beneficia aos grandes bancos e aos rentistas de sempre.
Nada, além disso, foi matéria do diálogo com o Presidente Temer. A UGT reafirma sua unidade de propósitos e sua solidariedade aos trabalhos dedicados à recuperação do nível de empregos e de investimentos estratégicos, junto com as demais Centrais Sindicais e Confederações Patronais, por exemplo, no Fórum de Desenvolvimento Produtivo, ora em andamento junto aos representantes do MDIC e sob coordenação da Casa Civil da Presidência da República.
UGT - União Geral dos Trabalhadores