08/05/2012
PORTA VOZ DOS BANCOS: Joca Levy, advogado, disse em artigo para o Estadão (A2, 21-04-12): Relevante fator adicional [depois da taxa Selic] ao custo de captação é a "cunha fiscal". Trata-se dos tributos, mais custo financeiro do compulsório - empréstimos a juros inferiores aos de mercado, que o banco é obrigado fazer à União - e subsídios obrigatórios, sob forma de empréstimos direcionados. Outro pesado componente da taxa são as perdas por inadimplência. Somadas à cunha fiscal e a custos administrativos, compõem mais de dois terços do spread". Termina o seu artigo com frase lapidar: "O setor financeiro, ao ser chamado a reduzir o spread, teria respondido com lista de reivindicações. Pode ou não ter errado na forma, mas no mérito está certo". Só faltou colocar uma auréola, daquelas que caracterizam os santos, em volta dos bancos, mostrando o inusitado altruísmo e benefício que oferecem à sociedade. Polêmico, este tipo de negócio já foi estatizado e privatizado, nacionalizado e internacionalizado. Hoje, no Brasil é uma mescla de tudo isso, mas, convenhamos, santo está longe de ser.
200 BILHÕES DE REAIS POR ANO: esta é a soma paga pelos brasileiros, todos os anos, a título de juros bancários. O levantamento, feito a pedido do jornal "O Estado de São Paulo", publicado no domingo (29/04), com autoria de Erivelto Rodrigues, presidente da empresa Austin Rating, abrange cinco linhas de crédito: cheque especial, crédito pessoal, crédito consignado, aquisição de veículos e de bens. De outra forma, o dado revela que o brasileiro gasta, em média, R$ 3,6 mil por ano de juros. No mínimo, um escândalo sem precedentes na conturbada história financeira do país.
PRÁTICAS DELETÉRIAS: a taxa Selic não é ingênua nem módica, está simplesmente entre as três maiores do mundo. É apenas uma referência, ninguém a segue. Segundo Maria Inês Dolci "menos juros estão disponíveis para quem põe mais dinheiro no Banco. Clientes com menos recursos têm ofertas escassas e condições pouco atraentes" (B6, Folhainvest, 30-04). O brasileiro que precisa de dinheiro, costumeiramente, não pesquisa. Pega o que vem pela frente, desde o empréstimo consignado mais barato ao agiota da esquina mais caro. Para o crédito direto ao consumidor olha se a prestação mensal cabe no seu bolso. Como os bancos não são filantropos, sim é preciso a tutela do governo para evitar abusos.
LUCROS ASTRONÔMICOS: os bancos brasileiros são os mais lucrativos do mundo. A cada ano, seus balanços demonstram que o país lhes oferece oportunidades únicas de rentabilidade. Eles são também especuladores que trabalham com câmbio, com bolsas, com commodities e, adicionalmente, com juros. Em geral, nos processos especulativos, apostam sempre para ganhar, seja a custa dos clientes ou do país. A moeda brasileira, o real, foi nos últimos anos um excelente fator de lucro, em função de sua valorização. Não é pecado num país capitalista, onde as relações entre o poder econômico e o governo sempre foram incestuosas. Mas, agora temos uma presidente que se preocupou com os juros extorsivos que os brazucas pagam. Sua primeira estratégia foi pedir aos bancos oficiais que reduzam os juros. Foi atendida. Os bancos particulares, além de pedir benesses tributárias, dão passos tímidos em direção à redução do spread. As centrais sindicais de trabalhadores estão ao lado de Dilma nessa guerra.
BANCOS PEITAM MANTEGA: Murilo Portugal, presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em entrevista à Agência Estado, praticamente peitou o ministro da Fazenda Guido Mantega. Fez uma série de exigências apresentando 20 itens numa lista de reivindicações e disse que os custos dos spreads chegam a 70%. Em outras palavras, culpou os impostos, a inadimplência e os depósitos compulsórios. Foi arrogante e, do outro lado do balcão, afirmou: "A bola agora está com o ministério". Pego de surpresa pela enorme repercussão de sua frase e reações negativas no interior do próprio governo, Murilo Portugal imitou o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, culpando os meios de comunicação em função do "mal-entendido".
ENTRAVES AO CRESCIMENTO: "É muito importante a gente perceber o que está em questão, hoje, no Brasil. Temos de desmontar alguns entraves ao nosso crescimento sustentável e continuado. Esses entraves podem ser assim resumidos na necessidade de colocarmos os nossos juros e spreads incluídos nos padrões internacionais de custo de capital". A declaração da presidente Dilma Rousseff foi feita em 13 de abril, na sede da CNI (Confederação Nacional da Indústria), onde discursou de improviso. Imediatamente, a presidente recebeu o apoio do empresariado e, Robson Andrade, presidente da CNI, disse ter certeza que os spreads podem ser reduzidos no Brasil. Criou-se, pois, um clima para que realmente os juros venham a cair e, para tanto, o governo e as organizações sindicais, patronais e de trabalhadores devem ficar atentas à evolução do tema.
DEPOIS DA ONDA: depois de toda a parte pirotécnica, em que os atores jogaram para a plateia, vieram os sinais reais: mudança nas regras da caderneta de poupança, a mais popular forma do brasileiro guardar dinheiro
foram anunciadas novas e contínuas baixas na taxa Selic, ainda entre as maiores do mundo
e utilização ostensiva dos meios de comunicação para colocar os especuladores (não há outro nome para quem empresta a 200% de juros ao ano) e forçar a baixa consensuada dos juros. Sabe-se que o poder do capital financeiro é muito grande, mas nenhum poder é maior do que o do Estado brasileiro.
RICARDO PATAH: o presidente nacional da União Geral dos Trabalhadores, Ricardo Patah, já vinha insistindo no tema e chegou a fazer fortes declarações contrárias aos juros praticados pelas empresas de cartões de crédito. Reafirmou suas críticas e hipotecou a solidariedade da terceira maior central sindical do país aos propósitos da presidente Dilma Rousseff. A UGT convocou manifestação contra os juros dos cartões de crédito para o dia 09/05/2012, às 10 h, na Avenida Brigadeiro Faria Lima, nº 3729, Itaim Bibi, São Paulo."
UGT - União Geral dos Trabalhadores