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UGT Press 537: Imprensa no divã


16/01/2017

MERYL STREEP: lamentavelmente, o discurso da consagrada atriz americana na cerimônia de entrega do Globo de Ouro (domingo, 8) foi interpretado às pressas e sob o prisma exclusivamente político. Inicialmente, também mal traduzido pela televisão, sobretudo a resposta de Donald Trump. A visão partidária das declarações da senhora Streep e da resposta do senhor Trump obscureceu o essencial da fala da atriz, importante e de peso. As primeiras e apressadas reações foram de apoio e rejeição, conforme a preferência da pessoa ou do meio de comunicação ouvidos. O contexto geral do discurso que contém séria crítica à imprensa americana, corresponsabilizando-a pelo fenômeno Trump, foi ignorado.  A frase mais importante da atriz, segundo Chris Cillizza, jornalista do NYT (New York Times) foi: "Precisamos de uma imprensa íntegra que faça os poderosos responder por seus atos e os repreendam a cada desmando".

 

TRISTE COINCIDÊNCIA: um dia depois (9, segunda-feira) faleceu o sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman, um dos arautos do "novo tempo", autor, entre outras coisas, da tese de "modernidade líquida", aliás um dos títulos de sua vasta obra, no Brasil editada pela Zahar Editora. Neste "novo tempo", onde se procuram explicações exatamente para situações que contrastam com os conceitos da civilização tradicional, entre fatos como o Brexit, o Não da Colômbia ou a eleição de Donald Trump, todos, a rigor, na contramão das velhas normas de conduta, há uma sensação de desorientação geral.  Ao analisar os acontecimentos do século passado, na virada do milênio, Bauman criou a teoria da "liquidez de nosso tempo", uma complicada tese esclarecendo a transição para um novo tipo de sociedade, esta em que vivemos, globalizada, onde os velhos conceitos são confrontados por massas influenciadas pelo individualismo/imediatismo que germina em todas as partes. "O filósofo polonês defende que a insegurança e o susto com as rápidas transformações da sociedade contemporânea marcam o desejo por liberdade que caracteriza o nosso tempo, e também a dificuldade que temos em encontrá-la" (escritor Ricardo Lísias, Estadão, 10/01).  

 

DIFICULDADES: há enormes dificuldades para se encontrar explicações, simples e inteligíveis, para os acontecimentos desta época. Há um esgotamento da democracia partidária, formal; há um fortalecimento da excepcionalidade, seja a existência de governos abusivos ou sistemas totalitários; e há um predomínio nocivo dos meios de comunicação, elegendo sempre a exceção em detrimento do convencional. Também é difícil fazer a conexão entre o pensamento de Bauman, os acontecimentos nos Estados Unidos ou na Inglaterra e, pasmem, até mesmo com a passividade bovina da sociedade brasileira ante o império da corrupção e desgovernos sistemáticos. Tudo é muito confuso e inexplicável porque contraria o bom senso e a normalidade. Normal é a existência de eleições limpas, governos honestos e predomínio da integridade. Quando Meryl Streep diz "precisamos de uma imprensa íntegra", ela coloca o dedo na ferida e põe na bandeja uma parte do problema. Todavia, está longe de acertar no todo. Bauman está mais perto, mas também não é tudo e, especialmente, está a léguas do entendimento médio das populações. Estas estão mais próximas dos meios de comunicação e assim estes influenciam mais e imediatamente o pensamento das pessoas que votam.

 

IMPRENSA E IDEOLOGIA: sem pretensões filosóficas ou intenções críticas, a imprensa moderna, com rapidez e agilidade, apesar da aparente falta de credibilidade (menos de 10% dos americanos, de acordo com o Instituto Gallup, disseram confiar nos noticiários de TV, jornais e internet), tem conseguido influenciar mais objetivamente a mente das pessoas e, com isso, obter o que ideologicamente os partidos e os sindicatos jamais conseguiram ao longo da história. Ao serem administrados por grandes conglomerados empresariais ou grupos econômicos, os meios modernos tendem a ser mais eficientes para difundir ideias ou fabricar fenômenos de mídia. São milhões de mentes à disposição, absorvendo as matérias do dia a dia. Não foram encontradas ainda formas para confrontar esse monumental tráfico de influência. Após a morte de Bauman, precisaremos de novos formuladores de ideias para contrabalançar essa perigosa tendência e oferecer explicações para essas anomalias indesejáveis que contrariam as normas civilizatórias. Uma Meryl Streep de vez em quando é muito pouco!




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