28/06/2016
PLEBISCITO: uma vitória apertadíssima (52 % contra 48%) levou o Reino Unido para fora do bloco europeu. Há 43 anos, a Inglaterra e os países do entorno faziam parte da União Europeia, conjunto de 28 países (agora 27), cuja montagem foi um quebra cabeça de décadas, mas que representou um exemplo e um caminho para a humanidade. Em termos de civilização, foi um passo à frente. Conflagrada, a região foi assolada por guerras ao longo da sua história. Após a Segunda Grande Guerra Mundial, na década de 1950, um grupo de líderes começou a esboçar os planos de unificação, algo que tinha como objetivo básico transformar o continente europeu em uma região de paz. Paz econômica, social e política.
ERRO DE CAMERON: o pretensioso David Cameron, primeiro ministro, convocou o plebiscito na certeza de que o Reino Unido permaneceria na União Europeia. Teve como objetivo consolidar a sua própria liderança e talvez a da Inglaterra, e de Londres como centro financeiro mundial, com nova voz no interior da Comunidade Europeia. Sua aposta revelou-se desde o início frágil e viu-se arruinada pela crise com os imigrantes, considerados pelos nativos como invasores e ladrões de empregos. Tanto que os resultados, sem análises mais profundas, mostram os jovens votando pela permanência e os mais velhos pela saída; os pobres, operários e os interioranos votando também pela saída; as pesquisas mostraram os mais instruídos votando pela permanência; em Londres, Irlanda do Norte e Escócia venceu a permanência. O resultado mais expressivo pela permanência ocorreu na Escócia, mais de 60%. Essa geografia eleitoral poderá ainda ter consequências: a Escócia poderá retomar as ideias de independência e a Irlanda do Norte poderá mudar sua posição, revendo o isolacionismo. Em outras palavras, os resultados podem representar um desastre político para o Reino Unido.
UM PASSO ATRÁS: a saída do Reino Unido da União Europeia, independentemente dos problemas econômicos, para os quais, com o tempo, sempre há solução, representa um passo atrás em termos civilizacionais. No mundo, as fronteiras (no início, as cercas e os muros) sempre significaram um potencial de guerra e destruição. A própria Inglaterra foi beneficiada pela luta mundial contra o nazismo, cujo primeiro objetivo foi a eliminação do seu potencial militar e econômico. Voltar atrás e tornar-se novamente apenas uma ilha é um gesto de miopia política. Nem é preciso voltar na história para lembrar da Guerra dos Cem Anos, das guerras napoleônicas, dos espanhóis e a Invencível Armada, de Trafalgar e suas trapalhadas no Oriente Médio. Reino lendário "onde o sol jamais se punha" começou a ser destruído com a Primeira Grande Guerra, consolidou sua decadência com a Segunda Grande Guerra e a ascensão dos Estados Unidos. Era parte importante de um grande bloco econômico. Não é mais.
VOLTANDO A SER UMA ILHA: certa vez, ao iniciar uma aula, o historiador Jules Michelet disse: "A Inglaterra é uma ilha". A frase ficou famosa por sua verdade intrínseca. A história da ilha é cheia de glórias. Feitos militares, culturais e esportivos fazem parte de seu orgulho nacional e, certamente, isso também contribuiu para que o individualismo prevalecesse. Contudo, a frase que mais diz sobre os ingleses é de Rudyard Kipling: "Ah, os ingleses ... Os ingleses são uma raça à parte". Inventaram inúmeros esportes, incluindo o futebol, o mais praticado do mundo; seu teatro shakespeariano é um exemplo soberbo; a luta contra a escravidão; a revolução industrial, etc., são todos feitos dignos. Sim, há também páginas negras como o colonialismo, o expansionismo, a pirataria e outras mazelas. Inventou até mesmo o seu próprio cristianismo. Então, por qualquer lado que se olhe, não se pode ignorar a Ilha. Com a União Europeia, a Inglaterra não era mais somente uma ilha, era parte de um continente e de uma ideia de integração. Isso se perdeu na quinta-feira, 23 de junho de 2016, data que alguns eurocéticos estão chamando de "nova independência".
UM TIRO NA GLOBALIZAÇÃO: a ideia de globalização tomou conta do mundo na segunda metade do século passado. A interdependência sempre foi uma realidade entre as nações. Hoje, nada mais se faz sem ter consequências globais. A saída do Reino Unido do bloco europeu é um tiro na globalização, na filosofia de blocos econômicos, na tentativa de eliminar fronteiras e no objetivo de integração dos povos. Sem dúvida foi um prejuízo em termos civilizacionais.
UGT - União Geral dos Trabalhadores