18/07/2022
Na tentativa de melhorar o preço de compra da mercadoria,
redes de supermercados diminuem determinados itens nas gôndolas até que se
chegue a um acordo com o fornecedor
Com a demanda em queda livre por conta da inflação, as redes
de supermercados têm trabalhado com estoques menores e buscado equilibrar
pedidos, ao encomendar apenas a previsão do que o consumidor vai de fato
comprar. Com essa maior seletividade, porém, tem aumentado a queda de braço
entre lojistas e indústria, que tem sido mais criteriosa nos descontos para grandes
encomendas.
Os mercados têm acertado em suas previsões. O índice geral
de rupturas (produtos que faltam nas prateleiras) calculado pela Neogrid,
empresa especializada em cadeias de suprimentos, teve ligeira queda em junho e
ficou em 11%, comparado aos 11,5% de maio. Esse não é um indicador de
desabastecimento, mas, sim, de faltas pontuais, que ocorrem em razão de
estoques menores e entregas postergadas.
"A ruptura do mês reflete um conjunto de fatores: o
aumento de preços; o varejo comprando menos e os estoques mais baixos; o
consumidor com menor poder aquisitivo; as compras em menor quantidade e a
procura por itens essenciais, com o cliente tirando do carrinho os itens
indulgentes (aqueles com os quais o comprador se presenteia)”, afirma Robson
Munhoz, diretor da Neogrid. Ou seja, com o consumidor comprando menos, ainda
que os estoques diminuam, não faltam tantos produtos da prateleira.
Segundo Munhoz, o varejo alimentar vem trabalhando com o
menor índice de estoques em dois anos. “As varejistas não estão mais comprando
por oportunidade, mas sim por necessidade. Diversas indústrias têm limitado os
volumes e, por isso, os descontos concedidos têm sido mais criteriosos”,
afirma.
Para ele, as varejistas estão aprendendo a calcular a
demanda do ponto de vista do consumidor. “É um ensaio mais apurado sobre o que
de fato vende", diz. "Estão aprendendo a entender a demanda
principalmente pelo uso de tecnologia.”
Mais negociações
O vice-presidente institucional da Associação Brasileira de
Supermercados (Abras), Marcio Milan, afirmou na quinta-feira, 14, que a
entidade tem estimulado os associados a negociar mais intensamente com a
indústria. A lógica é entender os aumentos de preços e identificar determinadas
altas injustificáveis. Ele diz que as negociações têm sido mais longas, exigido
mais informações e que isso não tem causado desabastecimento nas lojas.
"Não identificamos falta de produtos em razão da maior
negociação de supermercados com indústria", afirmou. Ainda assim,
eventuais quebras no fornecimento podem acontecer de maneiras pontuais.
"Ruptura é algo inerente à operação dos supermercados. Em momentos
inflacionários, normalmente há uma tendência disso aumentar", diz.
Isso ocorre porque, na tentativa de melhorar o preço de
compra da mercadoria, os estoques diminuem e faltam determinados itens nas
gôndolas até que se chegue a um acordo com o fornecedor. Como a demanda está
menos aquecida, porém, essas quebras estão menos frequentes. O consumo nos
lares brasileiros subiu 0,39% em maio em relação ao mesmo mês de 2021. Na
comparação com o mês imediatamente anterior, porém, houve queda de 3,47%,
influenciada pela sazonalidade. Os dados são da pesquisa Consumo nos Lares
Brasileiros da Abras.
Para Joelson Sampaio, professor de economia da FGV, o
cenário de inflação eleva o desafio para indústria e varejo na mesa de
negociações. “As varejistas têm de aumentar a pesquisa e comparação de preços e
produtos para conseguir melhorar as negociações. O atual momento demanda mais
estratégias para se obter um bom planejamento.”
Mesmo com a perspectiva de melhora da crise do combustível,
por conta da recente medida do governo envolvendo o ICMS, a continuidade da
ruptura na cadeia produtiva deve seguir tendo impacto para o varejo e a
indústria, afirma. “A falta de insumos e produtos na indústria acaba
dificultando as negociações”, diz.
O que falta
A indisponibilidade do leite longa vida nas gôndolas dos
supermercados em junho atingiu o maior patamar em um ano, e o segundo maior
desde janeiro de 2019. De acordo com dados da Neogrid, a falta do item nas
prateleiras registrou índice de 19,4% em junho, ante 18,8% no mês anterior.
Outro produto que também registrou alta de ruptura em junho, de 19,4% - a
segunda maior no ano -, foram os ovos de aves, que acabam substituindo a
proteína animal em muitas mesas. Em maio, o índice foi de 17%.
No caso do leite, Munhoz afirma que a ruptura elevada deve
se manter até o fim deste trimestre. Entre os motivos, estão estiagem, aumento
no custo da ração do gado e do valor do leite no varejo. "Isso afeta
também parte dos derivados, como leite condensado, iogurte, queijos, entre
outros", afirma.
Já os ovos obedecem a outro fenômeno: “O dólar aumentando, a
situação ainda de guerra na Ucrânia, a inflação elevada e o aumento nas tarifas
de luz causam efeitos em toda a cadeia de abastecimento. A indústria não
consegue sustentar aumentos e precisa repassar parte do custo - com
supermercados registrando margens muito apertadas e também não conseguindo
segurar o reajuste dos valores. Isso afeta o consumidor final - que passa a
buscar mais ofertas, marcas mais baratas, troca proteínas pelas mais em
conta", diz Munhoz.
Diferentemente do leite que, no mesmo período do ano passado
estava em um patamar parecido de rupturas (em 19,2% frente os 19,4% de agora),
os ovos estão 2,4 pontos porcentuais acima do registrado em junho de 2021.
Fonte e Foto: Estadão
UGT - União Geral dos Trabalhadores