15/07/2022
Dependente da importação de matéria-prima, país vive apagão
de remédios
Pela segunda vez em menos de três meses, a professora Ana
Elisa dos Santos, 36, tem enfrentado, sem sucesso, uma busca em quase uma
dezena de farmácias atrás de antibióticos para os filhos. O país vive um apagão
de medicamentos e insumos médicos.
Uma pesquisa feita pelo CRF-SP (Conselho Regional de
Farmácia de São Paulo) identificou que os antibióticos estão entre os
medicamentos com maior escassez no mercado. Remédios simples e classificados
como essenciais, como amoxicilina e azitromicina, são os que mais faltam nas
farmácias paulistas.
Segundo o levantamento, feito com 1.152 farmacêuticos de
todas as regiões do estado, 98,5% dos profissionais disseram sofrer com o
desabastecimento de remédios. Entre as categorias que mais relatam ter
dificuldade de comprar estão os antibióticos (93,5%), mucolíticos (76,5%),
antialérgicos (68,6%) e analgésicos (60,5%).
A pesquisa foi feita, de forma online, entre os dias 19 e 30
de maio deste ano. No entanto, o conselho diz que o desabastecimento persiste,
sem perspectiva de ações que solucionem o problema.
É a situação que Ana Elisa tem enfrentado pela segunda vez.
No início de maio, o filho mais novo de 5 anos teve uma otite e precisou tomar
azitromicina. Ela demorou quatro dias para encontrar o remédio.
Agora, percorre as farmácias novamente atrás do mesmo
medicamento para o filho mais velho, de 7 anos, que está com faringite.
"Na primeira vez, achei que fosse uma falta esporádica pela entrada do
outono e aumento das doenças respiratórias em crianças. Estou chocada em saber
que o problema continua."
Outra pesquisa, feita pelo CFF (Conselho Federal de
Farmácia), também identificou que 97,4% dos profissionais da área da saúde
tiveram problemas com o desabastecimento de remédios imprescindíveis.
O levantamento foi realizado entre 21 e 26 de junho deste
ano com 883 médicos, farmacêuticos, enfermeiros e administradores de unidades
de saúde de todas as unidades da Federação.
"Há meses estamos pedindo soluções para o problema e
nada muda. Também não há previsão de mudança a curto prazo. Enquanto isso, a
população vive uma situação sem precedentes de falta de remédios
essenciais", diz Luciana Canetto, vice-presidente do CRF-SP.
Os remédios que estão em falta nas farmácias e unidades de
saúde do país estão listados na Rename (Relação Nacional de Medicamentos
Essenciais), feita pelo Ministério da Saúde.
O ministério diz que o desabastecimento de remédios é
resultado de "diversas causas globais que extrapolam" sua
competência. Às entidades, a pasta tem dito que o problema é a dificuldade de
importação da matéria-prima dos medicamentos, que foi impactada pela guerra na
Ucrânia, pelo fechamento de portos na China em decorrência da pandemia de
Covid-19 e pela alta do dólar.
Cerca de 95% dos insumos para produzir medicamentos no
Brasil, incluindo o IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo), vêm da China e da
Índia.
Canetto diz que as entidades vêm há anos alertando sobre os
riscos de o país não ter uma política que fortaleça a autonomia da indústria
farmacêutica e que evitaria o desabastecimento vivido atualmente.
"Somos muito dependentes da importação da matéria-prima
e ficamos vulneráveis a essas questões externas. O Brasil tem tecnologia para
produzir o IFA, mas não deram condições financeiras para essa produção. Com
essa política, a indústria ficou refém da importação", diz.
Em nota, o Ministério da Saúde disse articular com a Anvisa
medidas para combater o problema e que "trabalha sem medir esforços para
manter a rede de saúde abastecida com todos os medicamentos ofertados pelos
SUS".
Uma das ações que o ministério diz já ter adotado foi
liberar critérios de estabelecimento ou de ajuste de preços para remédios com
risco de desabastecimento no mercado. Outra foi diminuir o imposto de
importação de insumos para alguns medicamentos, como dipirona e neostigmina.
"Essas medidas atenuaram parte do problema, já que
libera os fabricantes a vender alguns medicamentos pelo valor máximo. Então, o
consumidor volta a achar alguns remédios, como a dipirona, com mais facilidade,
mas com preço maior", diz Canetto.
Fonte e Foto: Folha de São Paulo
UGT - União Geral dos Trabalhadores