04/04/2022
Meio de
pagamento cria novas formas de monetização, mas especialista alerta para
superendividamento
À medida
que o Pix ganhou terreno entre os brasileiros, os cinco maiores bancos do país
viram suas receitas de serviços de conta corrente caírem quase R$ 2,7 bilhões
em 2021. Mas o sistema também abriu novas possibilidades de negócios e ganhos,
como a oferta de crédito para transações via Pix.
Depois do
Bradesco, pioneiro na modalidade, o Santander lançou, no início de março, a
opção de Pix parcelado, aquecendo a disputa no setor.
István
Kasznar, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas
da Fundação Getulio Vargas (FGV/EBAPE), destaca que o Pix e suas novas
funcionalidades se inserem na estratégia de transformação digital no sistema
financeiro.
"Não
surpreende que o sistema bancário, sobretudo o grande banco de varejo, esteja
tendo que rever o seu portfólio integrado de produtos, serviços e
tarifas", afirmou.
Em 2021, as
operações via Pix aumentaram mais de cinco vezes no Santander, com um valor
transacionado de cerca de R$ 20 bilhões entre pessoas físicas. Enquanto isso,
as receitas de serviços de conta corrente totalizaram R$ 3,80 bilhões, ante
3,96 bilhões em 2020, redução de 3,9%. Neste contexto, o banco avançou em uma
nova linha de negócio.
O
"Divide o Pix" é uma nova operação de crédito pessoal disponibilizada
pelo Santander, na qual o correntista pode parcelar o valor do Pix enviado em
até 24 vezes. Sobre a transação, no valor mínimo de R$ 100, incide a cobrança
de juros, que variam a partir de 2,09% ao mês, e IOF (Imposto sobre Operações
Financeiras).
"Normalmente,
as pessoas procuram o crédito parcelado depois de terem feito o consumo e
precisarem de um fôlego financeiro. Nosso pensamento foi de inverter essa
lógica e entrar no exato momento em que as pessoas estão consumindo",
disse Luciana de Aguiar Barros, diretora de Produtos de Crédito para Pessoas
Físicas do Santander.
Segundo
ela, 80% dos clientes que parcelaram o Pix não são tomadores triviais de
crédito. Na primeira semana de operações, o banco registrou mais de 2 mil
transações na modalidade, com parcelamento médio de 12 vezes e valor médio de
R$ 880 – o dobro quantia média das operações via Pix (R$ 400).
Segundo
outros funcionários do banco, um serviço no qual o cliente poderá escolher a
data de débito das transações efetuadas pelo sistema de pagamentos instantâneos
está em desenvolvimento.
Atender o
segmento de pessoas jurídicas na oferta de crédito via Pix está no radar do
Santander e também do Bradesco para os próximos meses.
O Bradesco
foi o primeiro a se lançar no segmento de serviço de crédito via Pix para
pessoas físicas, em novembro de 2020. Em pouco mais de um ano, atingiu 850 mil
pessoas e liberou R$ 170 milhões nesse tipo de empréstimo, com juros a partir
de 2,36% ao mês.
"No
último trimestre do ano passado, a gente cresceu mais de 70% o número de
conversão de crédito nessas jornadas contextuais de Pix", afirmou
Alessandro Zampieri, diretor de Produtos de Crédito do Bradesco. Hoje, o valor
médio das operações via Pix é de R$ 200.
Segundo
Julio Paixão, diretor de Empréstimos e Financiamentos, no momento em que o
cliente precisa de um valor complementar para poder concluir o pagamento via
Pix, o Bradesco oferece, em tempo real, a opção de crédito ao correntista, e a
pessoa decide na hora se aceita (ou não) as condições de empréstimo.
Diferentemente
dos concorrentes, o Bradesco não viu suas receitas de serviços de conta
corrente caírem no ano passado, mas teve uma redução de renda de tarifas
bancárias de R$ 7,98 bilhões para R$ 7,76 bilhões entre 2020 e 2021.
Roberto
Campos Neto, presidente do Banco Central, afirmou em um evento do BIS (Banco de
Compensações Internacionais) que as maiores instituições financeiras do país
entenderam ao longo do processo que, ao diversificar seus portfólios a partir
das novas oportunidades criadas pelo Pix, poderiam ampliar suas formas de
monetização.
Na esteira
da evolução do crédito via Pix, o Bradesco planeja incluir outro cenário de
oferta. "A gente fez muita jornada para cliente sem saldo limite, mas a
ideia é também oferecer opções de crédito para quem tenha saldo limite e queira
parcelar o Pix", disse Zampieri.
Enquanto
Bradesco e Santander estão mais avançados na discussão sobre o tema, Banco do
Brasil diz já ter iniciado os estudos para a oferta do serviço de crédito via
Pix e a Caixa afirma estudar formatos para viabilizar a disponibilização de
crédito. Ambos foram os principais afetados pela queda nas receitas de serviços
de conta corrente.
O Itaú é
outro que planeja entrar no segmento. Um projeto voltado para realização de
transações de pagamento com concessão de crédito, rotativo ou parcelado,
utilizando funcionalidades do Pix foi selecionado para fazer parte do Sandbox
Regulatório —iniciativa do BC que testa projetos financeiros inovadores.
A
iniciativa é encabeçada pela Itaucard, subsidiária do banco responsável pela
emissão e administração dos cartões de crédito. O Itaú, entretanto, não quis
comentar o assunto.
Para
Nathália Rodrigues, mais conhecida como Nath Finanças, o crédito via Pix pode
ser positivo para as famílias que estão precisando realizar o pagamento de uma
conta, por exemplo. Mas alerta: "Apesar do banco [Santander] dar essa
opção de parcelamento, a gente tem que entender se vale a pena mesmo
parcelar."
A
especialista em educação financeira destaca que a falta de conhecimento sobre o
crédito, somada ao encolhimento da renda do brasileiro, colabora para o
endividamento das famílias.
"O
endividamento tende a ser impulsionado quando não temos educação financeira,
quando não ganhamos um salário digno, não temos acesso ao crédito justo ou não
sabemos como usá-lo a nosso favor", disse.
A dica da
Nath Finanças para evitar o superendividamento, e a inadimplência, é esperar um
parcelamento acabar antes de começar outro. O parcelamento do Pix proposto pelo
Santander, por exemplo, não consome a linha de crédito dos cartões.
Em dezembro
de 2021, o nível de endividamento médio das famílias brasileiras bateu recorde,
atingindo 76,3%, segundo dados da CNC (Confederação Nacional do Comércio de
Bens, Serviços e Turismo).
Já o Serasa
identificou 64 milhões de brasileiros inadimplentes. A tendência é que esse
número suba neste ano com o aumento tanto da inflação quanto dos juros, com
destaque para as modalidades de cartão de crédito rotativo, cheque especial e
crédito consignado.
Os bancos
que oferecem empréstimo nas transações via Pix dizem prezar por um crédito
responsável. De acordo com o Bradesco, à medida que o comprometimento de renda
do cliente aumenta, sua capacidade de pegar crédito diminui.
Já o
Santander disse que o crédito no Pix parcelado oferece melhores condições que
outros tipos de serviços, como cheque especial, e reafirmou seu compromisso com
a saúde financeira de seus clientes.
Os bancos
que oferecem empréstimo nas transações via Pix dizem prezar por um crédito
responsável. De acordo com o Bradesco, à medida que o comprometimento de renda
do cliente aumenta, sua capacidade de pegar crédito diminui.
Já o
Santander disse que o crédito no Pix parcelado oferece melhores condições que
outros tipos de serviços, como cheque especial, e reafirmou seu compromisso com
a saúde financeira de seus clientes.
Fonte e
Foto: Folha de São Paulo
UGT - União Geral dos Trabalhadores