21/03/2022
Indignação se deve ao “marketing disfarçado de filantropia”
e pelo fato de as bebidas açucaradas causarem tantos malefícios à Saúde
coletiva
O Núcleo Gestor da Aliança pela Alimentação Adequada e
Saudável, coletivo do qual o SindiNutri-SP faz parte, encaminhou ao Presidente
do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) nota de
repúdio. O motivo se deu pela parceria firmada com a Coca-Cola Brasil e que
envolve o uso de R$ 3,5 milhões não reembolsáveis de recursos do BNDES.
Leia a nota e entenda o caso.
NOTA DE REPÚDIO
Ao Sr. Willames
Freire Bezerra
Presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de
Saúde – CONASEMS
Prezado Senhor,
A Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, coalizão
criada em 2016 que reúne organizações da sociedade civil, associações,
coletivos, movimentos sociais, entidades profissionais e pessoas físicas que
defendem o interesse público com o objetivo de desenvolver e fortalecer ações
coletivas que contribuam para a realização do Direito Humano à Alimentação
Adequada (DHAA), manifesta seu repúdio à parceria entre o Conselho Nacional de
Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) com a Coca-Cola Brasil.
Em 17 de fevereiro de 2022 foi anunciada a segunda fase da
parceria entre BNDES, CONASEMS e COCA-COLA Brasil. Trata-se do projeto
"Refrigeradores para Armazenamento de Vacinas", apresentado pela
Coca-Cola Brasil, no qual o BNDES apoiou com o valor de R$ 3,5 milhões não
reembolsáveis, e a Coca-Cola Foundation investe o mesmo valor, somando um total
de R$ 7 milhões, direcionados à conservação das vacinas para o combate à
pandemia causada pelo coronavírus. Ao todo serão contemplados 444 municípios
brasileiros de menor IDH, principalmente no Norte e Nordeste, que somam cerca
de 5 milhões de pessoas. Com os recursos, estima-se que sejam adquiridas mais
de 400 câmaras refrigeradoras, que possuem tecnologia apropriada para a
conservação de imunobiológicos.
Social Washing, ou o marketing disfarçado de filantropia,
versão covid-19. É o nome dado quando as corporações se apropriam de pautas
sociais e desenvolvem estratégias de marketing voltadas a fortalecer suas
marcas, mostrar engajamento social, preocupação com a sustentabilidade entre
outros temas importantes para a sociedade. A partir do início da pandemia em
2020, estamos convivendo com um número crescente de casos de Social Washing. Os
vazios da política pública e a lentidão dos governos em enfrentar a pandemia de
forma eficiente abriram um flanco para as grandes corporações mostrarem todo o
seu arsenal de possibilidades
(https://www.brasildefato.com.br/2020/09/09/socialwashing-ou-o-marketing-disfarcado-de-filantropia-versao-covid)
A questão é que neste caso veio com uma chancela
institucional importante: o CONASEMS, um colegiado que representa os
secretários municipais de saúde e que tem como missão a gestão da política
pública de saúde local.
A Coca-Cola é um dos maiores fabricantes de bebidas
açucaradas no mundo, e essas bebidas estão comprovadamente associadas ao
aumento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs), como obesidade,
diabetes, hipertensão, câncer e outras. Os portadores dessas DCNT compõem os
grupos de risco para a covid-19, visto que elas estão diretamente relacionadas
ao agravamento e configuram as principais causas de mortalidade por covid-19 no
Brasil.
Sem considerar os custos para a saúde pública onde R$3
bilhões são alocados anualmente somente para o tratamento destas doenças
provocadas pelo consumo exclusivo de bebidas açucaradas. E também nas isenções
fiscais em torno de R$3,8 bilhões (Receita Federal, 2016) que as grandes
empresas produtoras de bebidas açucaradas recebem. Há uma grande desigualdade
quando se compara os valores que estas empresas anunciam em ações e programas e
o retorno da sociedade. [1]
O CONASEMS recentemente também divulgou parceria com a
Novartis, indústria farmacêutica mais poderosa do mundo, sob a justificativa de
combater as doenças cardiovasculares no Brasil.[2] Quais os reais interesses
que, de um lado, uma empresa a qual os seus produtos contribuem para o aumento
de casos de obesidade e outras DCNT e, de outro, uma outra empresa que lucra
com a venda de medicamentos, têm ao associarem suas marcas com iniciativas que
aparentemente previnem os problemas que causam ou lucram com as doenças que
seus produtos anunciam curar? Este tipo de parceria pode comprometer o
interesse coletivo da saúde pública ou influenciar, de maneira imprópria, o
desempenho da função pública na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), o que
caracteriza conflito de interesses[3].
Diante do exposto, esperamos que o CONASEMS assuma uma
postura ética em sua missão para a implementação do SUS no nível municipal,
prevenindo o conflito de interesses em suas práticas por meio do rompimento
desta parceria e da não realização de novas atividades e/ou parcerias,
financiadas ou não, com indústrias, empresas ou organizações que possuem
produtos, práticas ou políticas relacionadas a modos de consumo e produção que
estejam em conflito de interesses com os princípios e valores da promoção da
saúde e que aumentem vulnerabilidades e riscos à saúde[4].
Fonte e Imagem: Sindinutri/SP
UGT - União Geral dos Trabalhadores