18/03/2022
Os rendimentos reais – isto é, já descontada a inflação – do
trabalho estão no menor nível desde 2012, apontam dados da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE). (Por Vandré Kramer) - foto Paulinho Costa feebpr -
No último trimestre de 2021, a média mensal de todas as
ocupações foi de R$ 2.447, 10,76% abaixo do mesmo período de 2020. As maiores
perdas de poder aquisitivo estão entre os empregadores – cujos ganhos reais
caíram 14,34% em um ano, para R$ 5.834 por mês em média – e entre os
trabalhadores da indústria (-15,92%).
A queda no rendimento ocorreu apesar do aumento do número de
pessoas ocupadas e da queda do desemprego ao longo de 2021.
Ao menos três fatores explicam essa retração nos ganhos dos
trabalhadores, segundo o economista Rodolfo Margato, da XP Investimentos:
A inflação persistentemente alta;
A participação crescente das categorias de emprego informal
que, em média, têm rendimentos mais baixos; e
Desequilíbrios setoriais causados pela pandemia, como o
deslocamento de mão de obra e o impacto sobre a produtividade, que está quase
9% abaixo dos níveis pré-pandemia.
A renda caiu mesmo quando se considera apenas o mercado
formal de trabalho. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados
(Caged), embora o país tenha criado 2,7 milhões de empregos com carteira
assinada em 2021, o salário médio de contratação caiu 6,1%, já descontada a
inflação.
Segundo o boletim Salariômetro, da Fundação Instituto de
Pesquisas Econômicas (Fipe), 50,2% das negociações salariais de 2021 terminaram
com reajuste inferior à inflação, o que ajuda a explicar a perda real nos
ganhos dos trabalhadores formais.
O impacto maior da aceleração inflacionária, segundo
economistas do Itaú, está nos preços dos produtos comercializáveis, que não foi
acompanhada pelo crescimento nominal dos salários. Além disso há a queda na
produtividade. “A diminuição do rendimento real pesa sobre o consumo das
famílias”, escrevem os economistas em relatório.
O banco Inter destaca que o aumento de trabalhadores por
conta própria, na busca por uma alternativa no mercado de trabalho, também fez
pressão sobre o rendimento, já que este grupo tem renda média menor. O número
de trabalhadores nesta categoria chegou a 25,9 milhões no fim de 2021, 13%
acima do mesmo período e também o maior da série histórica da pesquisa Pnad
Contínua, iniciada em 2012.
“Mesmo com a volta do emprego para patamares iguais aos do
pré-pandemia, a população teve uma redução de renda média em conjunto com o
aumento da desigualdade regional, com piora do mercado de trabalho,
principalmente no Nordeste, região com maior taxa de subutilização, piora mais
acentuada nas taxas de desemprego frente ao quarto trimestre de 2019 e menor
número de empregados com carteira assinada”, aponta relatório do Inter.
Eduardo Vilarim, economista do banco Original, aponta que o
número maior de pessoas subocupadas – ou seja, que trabalham menos horas do que
gostariam – também contribui para pressionar os rendimentos para baixo.
Recuperação econômica está ficando mais lenta
Um fator que complica esse cenário, segundo Rafaela Vitória,
economista-chefe do banco Inter, é que a recuperação econômica está se tornando
mais lenta. Depois de a economia crescer 4,6% no ano passado, a maior expansão
em 11 anos, a expectativa do mercado financeiro para 2022 é de um crescimento
do PIB próximo de 0,5%. O governo federal, enquanto isso, prevê alta de 1,5%.
O IBC-Br, índice de atividade econômica calculado pelo Banco
Central e que costuma antecipar a trajetória do PIB, recuou 0,99% no primeiro
mês do ano, resultado pior que as expectativas.
Segmentos como o de serviços prestados às famílias ainda não
se recuperaram da crise. Em dezembro, o nível de atividade ajustado
sazonalmente era 5,5% menor que o de fevereiro de 2020, antes do estouro da
crise.
Trabalhadores da indústria também sentem os reflexos
adversos da deterioração da atividade econômica. Em dezembro, os rendimentos
reais eram 15,92% menores dos que em igual mês do ano passado.
Essa retração está associada a uma percepção de maior aperto
na atividade, diz Rafaela. Os custos industriais aumentaram 28,39% no ano
passado, segundo o Índice de Preços ao Produtor (IPP) do IBGE. E a utilização
da capacidade instalada, de acordo com a Confederação Nacional da Indústria
(CNI), caiu de 82,3% em junho de 2021 para 79,6% em dezembro, 0,7 ponto percentual
abaixo do registrado no mesmo mês de 2020.
Como a queda da renda afeta a economia
A principal implicação dessa queda dos rendimentos do
trabalho é uma trava no consumo, que responde por 64,9% do PIB brasileiro. E
essa situação vem em um momento preocupante, diz a economista-chefe do Inter,
por causa do aperto monetário promovido pelo BC.
Nesta quarta (16), o Banco Central elevou a taxa básica de
juros (Selic) pela nona vez consecutiva, para 11,75%, o maior patamar em quase
cinco anos. Essa alta deve encarecer ainda mais o custo do crédito.
“Os juros estão aumentando e, com isso, pressionando o
endividamento das famílias. O comprometimento da renda está em padrões
históricos elevados”, diz a economista-chefe do Inter.
Dados do BC apontam que o endividamento das famílias com o
sistema financeiro nacional corresponde a 51,94% da renda acumulada em 12
meses. Esse cenário acaba por contribuir para retardar a recuperação da
atividade econômica, diz Rafaela.
Um cenário para a recuperação do poder de compra dos
rendimentos vai depender muito da queda na inflação. Porém, neste momento
ocorre uma revisão para cima nas expectativas – o ponto médio das projeções de
bancos, corretoras e consultorias para o IPCA está em alta há nove semanas e
chegou a 6,45%. O que, se confirmado, vai representar o segundo ano seguido de
estouro da meta de inflação.
As expectativas já vinham subindo e ganharam força com o
ataque da Rússia à Ucrânia, que jogou mais para cima as cotações do petróleo,
do minério de ferro e das commodities agrícolas. (Fonte: Gazeta do Povo).
Fonte e Foto: Feebpr
UGT - União Geral dos Trabalhadores