10/08/2021
Em seu último dia, o Seminário dos Povos
Indígenas, realizado pela União Geral dos Trabalhadores (UGT), em parceria com
o Instituto Solidarity Center, abordou o tema “Construindo um outro Mundo
Possível”, com apresentação de dois painéis: “Desafios para a Decolonialidade”,
apresentado pelo premiado escritor indígena, Daniel Munduruku; e o painel “Bem
Viver: uma Alternativa dos Povos Indígenas para o Brasil”, apresentado pelo
escritor, ambientalista e conferencista indígena, Kaka Werá Jekupé.
Antes do início das exposições dos painéis,
o Coordenador Administrativo da Secretaria de Organização e Formação
Político-sindical, professor Erledes Elias da Silveira, lembrou aos participantes
que em outubro de 2021, serão realizados mais dois Módulos do Seminário, com
os temas: “Marco Legal”, dos dias 04 a
06, e “A Comunicação como Ferramenta
Estratégica para os Povos Indígenas”, dos dias 25 a 27 do referido mês. Erledes
ressaltou que essa temática atende as preocupações que o parceiro Instituto
Solidarity Center, assim como a UGT, tem sobre a importância dos sindicatos e
do Movimento Sindical de abraçar a luta em defesa dos povos indígenas, para
preservar suas culturas, costumes e suas terras como fator de sobrevivência.
O Brasil, enquanto Nação, nunca teve uma
Política de Proteção para os Povos Originários!
Em sua exposição, o escritor Daniel
Munduruku, lembra que até os anos 60 os povos indígenas viviam no mais absoluto
esquecimento e que, só a partir de 1988, com a Constituição Cidadã, é que
surgem algumas políticas de preservação e ampliação dos direitos dessa
população, mesmo assim, com enormes dificuldades para implantação dessas
políticas.
Apesar de termos uma enorme diversidade com
305 etnias, falando mais de 274 línguas e cerca de 1 milhão de indígenas, os
governos brasileiros, historicamente, impram à sociedade inúmeras visões
equivocadas sobre esses povos: a Visão Romantizada que prevaleceu no século XX;
a Visão Estigmatizada, onde os povos indígenas eram considerados como “coisa do
passado”, e, portanto, não faziam parte da nossa realidade; a Visão
ideologizada, parte do pressuposto de que os indígenas são pessoas ruins,
assassinos, selvagens e canibais; a Visão Integralizada, que exclui os
indígenas da sociedade, prevalecente até hoje.
Porem, a Visão que prevalece na atualidade
com força é a do Agronegócio, onde os povos indígenas estão sendo considerados
como entrave ao desenvolvimento do país. Ou seja, “ser indígena não é Pop, Pop
mesmo é Agro”. Infelizmente, essa Visão do Agronegócio é a que dá base de
sustentação aos graves ataques e ameaças que o Governo Bolsonaro tem exercido
às Nações Indígenas em todo o país, em especial na região Norte, os Projetos de
Leis que permitem o desmatamento, a grilagem, a mineração e os mais variados
tipos de exploração das terras indígenas, numa clara ameaça à vida e a
sobrevivência desses povos.
Daniel Munduruku ainda ressalta as
dificuldades que os jovens indígenas têm passado, como o de serem aceitos e
respeitados dentro das universidades, de serem estigmatizados quando dominam o
conhecimento e, principalmente, o uso desses conhecimentos e das ferramentas
tecnológicas, como a internet e redes sociais, para defender, preservar e divulgar
suas culturas.
Antes de finalizar sua exposição, Daniel
fez questão de esclarecer dois importantes conceitos. Um sobre o Tempo: o
conceito de tempo dos indígenas é o tempo da natureza, bem diferente do
conceito ocidental. O outro sobre o conceito da existência humana que, para os
indígenas, é baseada na questão do Ser, bem diferente da visão ocidental que
tem como base a questão do Ter, de Possuir, cada vez mais, “coisas”, nem que
para isso a humanidade destrua todas as riquezas naturais do planeta.
Bem Viver, uma Alternativa para o Brasil
O ambientalista Kaká Werá, iniciou sua
palestra dizendo que desde o século XVI já existia o debate sobre a escravidão
dos indígenas pelos colonizadores, o que ocorreu em todo território nacional.
Na época, os indígenas viviam “entre a cruz e a espada”. Ou seja, a cruz dos
jesuítas, que exploravam o trabalho indígena, os quais tinham uma carga de
trabalho de 8 horas e folga aos domingos; e entre a espada dos “invasores” ou
colonizadores, que exploravam o trabalho indígena por mais de 16 horas, de
segunda a segunda, com poucas horas de descanso diário.
A questão da escravidão indígena pelos
colonizadores e, posteriormente, pelos escravocratas brasileiros, sempre foi,
de certa forma, apagada da historiografia brasileira, a qual imputou aos povos
originários a visão de que eram preguiçosos, dormiam muito e que, portanto, não
serviam para o trabalho.
A visão de desenvolvimento dos povos
indígenas, particularmente para os Tupi Guarani, tem como princípio o respeito
ao “tempo da terra” e a visão do “Ser como fator essencial à vida.” Para eles,
o Tekoha que significa “Bem Viver” ou “o lugar onde somos o
que somos”. Porém, o significado dessa palavra vai além de uma questão
territorial. Para eles, a terra não é apenas o lugar onde pisamos, mas também
onde seus costumes são desenvolvidos e preservados.
Portanto, o desenvolvimento deve considerar a terra (o planeta) como elemento vivo, inteligente e consciente, onde o tempo de plantar, de colher, de descanso da terra e de festejar devem ser respeitados e considerados como fator de desenvolvimento sustentável. Afinal, somos todos filhos da Terra, e cabe a todos os seres humanos a preservação da natureza, pois é dela que encontramos os elementos necessários à nossa existência enquanto espécie. Nesse sentido, a pergunta que devemos fazer à sociedade é “O que você vai ser como Ser?”, finaliza o ambientalista Kaká Werá.
UGT - União Geral dos Trabalhadores