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Estados americanos enfrentam maior crise de caixa desde a Grande Depressão


30/10/2020

Em todo o país, o déficit fiscal dos estados de 2020 a 2022 poderá chegar a cerca de US$ 434 bilhões

 

Connecticut agiu rápido. Distanciamento social, bloqueios e testes cortaram os casos de Covid-19 na primavera.

 

Mas quando o fiscal de contas Kevin Lembo abriu um e-mail de seu diretor de orçamento em 15 de abril ficou claro que a agilidade do Estado para conter a pandemia não havia protegido suas finanças.

 

"Pisamos tão rápido no freio da economia que passamos pelo para-brisa", escreveu seu vice.

 

Connecticut projeta uma queda total em suas receitas de US$ 8,4 bilhões até o ano fiscal de 2024 —mais que o dobro do fundo de reserva acumulado nos últimos três anos.

 

"Tudo o que se pode fazer é segurar a barra o mais forte possível, tomar as decisões mais inteligentes em tempo real, planejar para o pior e se surpreender com algo menos que o pior", disse Lembo.

 

Em todo o país, o déficit fiscal dos estados de 2020 a 2022 poderá chegar a cerca de US$ 434 bilhões, de acordo com dados da Moody's Analytics, o braço de análise econômica da Moody's Corp. As estimativas pressupõem nenhum estímulo fiscal adicional de Washington, mais restrições a empresas e viagens causadas pelo coronavírus e custos extras para o Medicaid em meio ao alto desemprego.

 

Isso é maior que o orçamento da educação primária e secundária (K-12) de 2019 em todos os estados combinados, ou mais que o dobro do valor gasto naquele ano em estradas estaduais e outras infraestruturas de transporte, segundo a Associação Nacional dos Oficiais de Orçamento do Estado.

 

Os déficits já geraram aumento de impostos e cortes na educação, presídios e parques. Funcionários públicos estão sendo demitidos ou sofrendo cortes salariais, e os benefícios de aposentadoria para policiais, bombeiros, professores e outros servidores sofrem mais pressão.

 

Mesmo depois que os fundos de reserva forem usados, a Moody's Analytics projeta déficits em 46 estados, com Nevada, Louisiana e Flórida tendo os maiores buracos como porcentagem do orçamento de 2019. A Louisiana disse que não espera que seu déficit seja tão grande quanto a previsão da Moody's.

 

"Não existe um modelo real para uma crise como esta", disse a tesoureira de Nova Jersey, Elizabeth Maher Muoio. "Vai ser difícil nos próximos dois anos."

 

O estado de Nova Jersey espera um declínio de receita de mais de US$ 5 bilhões para o ano fiscal de 2021, uma queda de 13% em relação à projeção do estado anterior à Covid. Já um dos estados mais endividados do país, Nova Jersey autorizou um plano contestado para contrair empréstimos de até US$ 10 bilhões; aumentou impostos sobre pessoas que ganham entre US$ 1 milhão e US$ 5 milhões; e está fazendo mais US$ 1 bilhão em cortes para ajudar a preencher a lacuna.

 

 

Vendedor oferece notas falsas com a imagem de Donald Trump durante a campanha de 2016 - Justin Merriman - 22.out.2016/Getty Images/AFP

Os estados dependem de impostos para sua receita —impostos sobre vendas e renda representam mais de 60% da receita que os estados arrecadam para verbas operacionais gerais, de acordo com o Urban Institute. Esses impostos foram esmagados por perdas históricas de empregos e pelo declínio mais acentuado dos gastos do consumidor em seis décadas.

 

Desde então, os americanos aumentaram seus gastos em tudo, desde reformas de casas até bicicletas, com a ajuda dos cheques de estímulo enviados a milhões de pessoas, embora os gastos gerais permaneçam abaixo dos níveis pré-pandêmicos.

 

Os estados que obtêm grande parte de sua receita dos setores mais duramente atingidos estão sofrendo. Os americanos estão se deslocando e viajando muito menos, e os preços do petróleo despencaram, atingindo as indústrias de energia do Texas, Oklahoma e Alasca. O turismo caiu na Flórida, Nevada e Havaí, e o fechamento de cassinos prejudicou Rhode Island, Nova York e Illinois.

 

O Havaí, por exemplo, espera em 2020 menos da metade dos visitantes que recebeu no ano passado, e as autoridades estaduais preveem que as receitas do seu fundo geral só se recuperarão dos níveis anteriores à pandemia no ano fiscal de 2025.

 

Para os anos fiscais de 2020 a 2022, a receita média anual nos 50 estados somados deve ficar aquém do total de 2019, disse a Moody's Analytics.

 

Um declínio nacional na receita combinada dos estados aconteceu apenas depois de dois eventos em 90 anos: os ataques de 11 de setembro de 2001 e a crise financeira de 2008.

 

A receita anual dos estados caiu após os ataques de 11 de setembro e o estouro da bolha das pontocom nessa época, mas se recuperou em um ano. Durante a recessão que se seguiu à crise de 2008, a receita dos governos caiu 9% em dois anos, segundo dados do Departamento do Censo.

 

Desta vez, o déficit pode chegar a 13% em dois anos, segundo as projeções da Moody's Analytics.

Um aumento dos casos de Covid-19 para novos recordes diários nos últimos dias torna esse cenário cada vez mais provável.

 

A economia dos Estados Unidos tem se recuperado de forma constante desde a primavera, e mais de 11 milhões de empregos, dos 22 milhões perdidos no início do ano, voltaram. Ainda assim, a taxa de desemprego era recentemente 7,9%, e houve um aumento nas demissões permanentes.

 

Economistas alertam que uma recuperação de duas vias está surgindo, com pessoas instruídas e ricas e algumas empresas prosperando, ao mesmo tempo que trabalhadores com salários mais baixos e menos credenciais, empresas tradicionais e regiões ligadas ao turismo estão presos num profundo declínio.

 

A força de trabalho dos estados encolheu 5% em todo o país de fevereiro a setembro, para 4,9 milhões —menos pessoas do que em qualquer momento durante ou após a recessão de 2008, de acordo com o Departamento de Estatísticas do Trabalho. Os funcionários de governos locais caíram 6%, ou quase 1 milhão de pessoas, e as reduções nas receitas locais aumentam a pressão sobre os orçamentos estaduais.

 

Em Michigan, mais de 31 mil funcionários públicos tiveram licença de dois dias por período de pagamento durante dez semanas, enquanto outros foram dispensados temporariamente. Um porta-voz disse que as demissões temporárias acabaram e nenhuma está planejada no momento, mas que elas poderão ser reconsideradas se os resultados econômicos piorarem.

 

No início deste ano, Chris Kolb, diretor de orçamento de Michigan, calculou que mesmo que eliminasse 12 departamentos estaduais —incluindo educação, meio ambiente e tesouro— e usasse cada centavo das reservas estaduais, Michigan ainda teria um déficit de US$ 1 bilhão para equilibrar suas despesas.

 

A ajuda federal contra o coronavírus e os fundos de reserva finalmente o ajudaram a equilibrar o orçamento e cobrir as despesas relacionadas à Covid, e algumas receitas fiscais foram melhores do que se previa. Mas o estado se prepara para um déficit de até US$ 2 bilhões para o próximo ano fiscal, já que US$ 4 bilhões em receitas fiscais previstas para janeiro desapareceram.

 

"Nós realmente temos águas desconhecidas à frente", disse Kolb neste mês. "As ondas parecem cada vez mais revoltas."

 

Depois de 2008, alguns estados implementaram ou aumentaram os fundos "para dias chuvosos" —reservas de caixa que podem ser usadas para preencher lacunas causadas por um choque potencial. Os fundos são importantes porque as leis estaduais normalmente não permitem que os estados complementem as receitas operacionais com empréstimos, ao contrário do governo federal, que ajuda a financiar suas operações com títulos do Tesouro. Os estados, por outro lado, geralmente emitem títulos para projetos específicos, como a construção de estradas ou pontes.

 

No final do ano fiscal de 2019, os fundos estaduais de reserva tinham acumulado cerca de US$ 50 bilhões a mais que na década anterior, de acordo com o Pew Charitable Trusts, colocando cerca de dois terços dos estados em melhor posição do que estavam antes da crise de 2008.

 

Os estados tinham uma mediana mais de quatro vezes maior que o número de dias de caixa disponível do que quando saíram da recessão em 2010. O fundo de reserva de Connecticut no final de 2019 estava em 11º lugar entre os 50 estados, de acordo com a Pew, com cerca de 40 dias em dinheiro disponível. O estoque cresceu para cerca de dois meses de caixa em 2020.

 

Ohio, como Connecticut, tinha esvaziado suas reservas em 2010 e possuía cerca de um mês de caixa quando a Covid começou.

 

Desde então, Ohio cortou US$ 300 milhões de seu orçamento de educação K-12 para o ano fiscal de 2020 e reduziu os salários de alguns funcionários estaduais.

 

As escolas de Willoughby-Eastlake City, perto de Cleveland, perderam US$ 1,7 milhão em fundos estaduais neste ano e esperam perder mais US$ 1,7 milhão em 2021. O distrito escolar enfrentou as despesas reduzindo pela metade o orçamento curricular e comprando menos livros didáticos e outros materiais de aprendizagem, entre outros cortes.

 

Se o dinheiro não chegar logo, o distrito terá que reduzir a oferta de cursos, disse o superintendente, Steve Thompson.

 

Os sistemas escolares também costumam receber verbas locais por meio de impostos sobre a propriedade. Neste ano, o sistema Willoughby-Eastlake recebeu até agora US$ 800 mil a menos que no ano passado, disse o tesoureiro distrital, pois os residentes desempregados têm dificuldade para pagar o imposto.

 

As escolas receberam ajuda federal dos pacotes de estímulo contra a pandemia aprovados pelo Congresso no início do ano. Willoughby-Eastlake recebeu US$ 1,3 milhão, que usou em tecnologia, saúde, suprimentos de limpeza e cuidadores adicionais. O dinheiro foi gasto rapidamente, disse o superintendente.

 

Cerca de 30% dos cerca de 8.000 alunos do distrito se qualificam para o almoço grátis ou a preço reduzido, e muitos não têm computadores ou acesso à internet em casa. O distrito, que oferece aulas online, comprou centenas de computadores e "hot spots". "Nesta altura, estamos gastando dólares de nosso fundo geral", disse Thompson, que estimou que os custos totais de tecnologia e segurança da saúde desde o início da pandemia até o final do atual ano letivo se aproximarão de US$ 4 milhões.

 

Os professores estão gravando aulas para que os alunos de famílias que compartilham um computador possam assistir às aulas online perdidas porque seus irmãos estão usando o computador para suas próprias aulas.

 

"Se eles tiverem alguma dúvida, terão que esperar até o dia seguinte, quando será sua vez de receber o notebook do irmão ou da irmã", disse Thompson.

 

A Associação Educacional de Ohio, um sindicato de professores, disse que os distritos escolares do estado podem enfrentar déficits orçamentários para os anos fiscais de 2022 e 2023 entre 20% e 25%.

 

Nova York, projetando um déficit de US$ 59 bilhões até 2022, reteve os pagamentos programados para escolas e serviços sociais e adiou os aumentos dos funcionários públicos. O Missouri reteve o financiamento de serviços para idosos e outros programas. O governador da Flórida vetou gastos em uma série de itens, incluindo um novo tribunal estadual, escolas técnicas e verbas para projetos locais.

 

Alguns estados provavelmente sobreviverão à pandemia em boa forma, graças a economias robustas, controles financeiros rígidos ou economias locais isoladas dos piores impactos do distanciamento social.

 

Wyoming, embora dependa dos preços da energia, tem um fundo de reserva muito grande em relação a outros estados. Minnesota e Carolina do Norte têm algumas das classificações de crédito mais altas do país e promovem uma combinação de manufatura, educação, serviços de saúde e negócios, de acordo com o Moody's Investors Service, braço de classificação da Moody's.

 

Muitos estados estão implorando por mais ajuda do Congresso, que até agora enviou dinheiro em seus pacotes contra o coronavírus para enfrentar a crise sanitária, mas não para compensar a perda de receitas.

 

O Congresso distribuiu cerca de US$ 150 bilhões em resposta à Covid-19 aos governos estaduais e locais, além de algum dinheiro adicional para cobrir os elevados custos do Medicaid. O dinheiro enviado aos governos locais ajudou a pagar necessidades como equipamentos de proteção individual. Mas não pode ser usado para repor a receita perdida em consequência do bloqueio social.

 

Nas últimas semanas, negociadores da Casa Branca e do Partido Democrata discutiram cerca de US$ 2 trilhões em estímulos adicionais, mas o valor encontrou resistência no Senado controlado pelos republicanos, em meio a preocupações com o aumento da dívida e algumas das disposições esperadas, e é improvável que surja um acordo antes da eleição.

 

Nas negociações, a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, e autoridades da Casa Branca se aproximaram sobre muitas questões, incluindo a quantia de ajuda adicional a ser dada aos governos estaduais e locais, mas ainda não haviam chegado a um acordo finalizando um valor.

 

O presidente Trump e o líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, disseram que não querem que a ajuda da Covid-19 seja usada para resolver problemas financeiros antigos. McConnell sugeriu em abril que os estados deveriam ser autorizados a pedir falência para pagar suas dívidas previdenciárias. Trump perguntou em um tuíte naquele mês: "Por que as pessoas e os contribuintes deveriam salvar estados mal administrados como Illinois?"

 

Illinois, com as piores finanças dentre todos os estados, tem recebido bilhões em verbas federais. O estado tem um passivo de aposentadorias de US$ 230 bilhões, depois de anos adiando pagamentos, de acordo com uma estimativa do Moody's Investors Service, e enfrenta um pacote adicional de US$ 8 bilhões em contas atrasadas.

 

Desde a pandemia, os passivos totais de aposentadoria e dívidas de Illinois deverão representar 45% do PIB estadual em junho de 2021, contra 35% em 2019, de acordo com o Moody's Investors Service.

 

Illinois foi um dos únicos dois mutuários a aproveitar os empréstimos oferecidos pelo Federal Reserve (banco central) como parte dos pacotes de ajuda. A Autoridade de Transporte Metropolitano de Nova York foi o outro.

 

Illinois emitiu US$ 1,2 bilhão em títulos, mas os fundos são caros, com uma taxa de juros cerca de dez vezes maior que a do mercado. O estado disse que poderia pedir mais empréstimos. Uma porta-voz do estado não respondeu aos pedidos de comentários.

 

Nos últimos seis meses, houve 51 primeiras inadimplências no pagamento de títulos, segundo dados da Municipal Market Analytics. É o nível mais alto nesse período de tempo desde 2012, quando uma série de mutuários que ainda se recuperavam da última recessão ficou sem dinheiro para saldar suas dívidas.

 

Embora nenhuma das inadimplências recentes tenha envolvido créditos estaduais, alguns governos locais estão enfrentando tensões no repagamento. A autoridade aeroportuária de Rock Island County, em Illinois, por exemplo, revelou em agosto que não conseguiu coletar o suficiente em taxas de passagens aéreas para manter o nível de reserva de caixa que havia prometido aos detentores de títulos. A autoridade preencheu a lacuna com outros fundos, como receitas de estacionamento, e pode considerar o adiamento de projetos importantes, disse seu diretor-executivo.

 

Em Connecticut, os custos da dívida reduziram a flexibilidade de gastos do estado. Antes da pandemia, os pagamentos anuais de dívidas de títulos, pensões e obrigações de saúde dos aposentados absorviam 31% da receita gerada pelo estado, de acordo com o Moody's Investors Service, tornando-o um dos mais endividados do país.

 

Grande parte do passivo de Connecticut decorre dos esforços do Estado para arcar com o fardo de cidades em decadência. Quase um terço de sua dívida total remonta a aposentadorias locais para professores e benefícios de saúde para aposentados, disse o Moody's Investors Service, grande parte dela desde a década de 1990, quando as autoridades burlaram o pagamento de aposentadorias.

 

Dois anos atrás, o estado protegeu a dívida emitida por sua capital, Hartford, que sinalizava uma possível declaração de falência.

 

Os empregos em hotelaria e lazer do estado caíram cerca de 50% no auge das paralisações, de acordo com o Fed de Boston, e ainda estavam cerca de 25% abaixo em agosto, apesar de uma recuperação parcial. A taxa de desemprego total do estado era de 9,5% em agosto.

 

A enxurrada de compras de casas à medida que as pessoas fugiam de Nova York para cidades de Connecticut teve benefícios de receita limitados. A arrecadação de impostos do estado sobre vendas de imóveis alcançou o pico em dez anos, de US$ 47 milhões, em agosto, segundo o departamento da receita estadual, mas a arrecadação total de abril a agosto permanece menor que a dos últimos dois anos.

 

Para resolver o déficit fiscal deste ano, o governador de Connecticut está recomendando que o estado faça cerca de US$ 25 milhões em cortes e use seu fundo de reserva. O estado evitou reduzir o financiamento para provedores de serviços sociais, apesar da perda de receitas, disse Melissa McCaw, secretária do Escritório de Políticas e Gestão do estado.

 

Grupos que oferecem tratamento de saúde mental e para abuso de substâncias receberam ajuda federal para cobrir os custos de saúde e segurança relacionados à Covid, mas também solicitaram ajuda estadual adicional. McCaw disse que o estado "continuará monitorando as necessidades dos fornecedores".

 

Connecticut tem sido historicamente um dos dez principais estados com overdoses de drogas, que aumentaram durante a pandemia, atingindo um pico no primeiro trimestre de 2020 mais alto que em qualquer um dos oito trimestres anteriores, de acordo com os Centros para Controle e Prevenção de Doenças.

 

A Community Health Resources, que oferece serviços de saúde mental e dependência química para 27 mil crianças e adultos, está preocupada em não receber verbas estaduais estimadas em mais de US$ 40 milhões —62% do orçamento anual da organização— no próximo ano fiscal, que começa em julho.

 

"Trabalhamos com pessoas que, se não fosse por nossos serviços, estariam em pronto-socorros", disse a presidente, Heather Gates.

 

fonte: Folha de SP | THE WALL STREET JOURNAL

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves




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