28/05/2019
Esgotamento profissional – chamado de síndrome de burnout – passará a ser reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como doença. Estima-se que 72% dos trabalhadores brasileiros tenham problemas de estresse e, entre eles, 32% sofreriam de burnout.
Chegar ao supermercado e se sentir perdida em seus corredores – e totalmente incapaz de decidir qual macarrão levar. Foi assim que a empreendedora Rafaela Cappai, de 40 anos, percebeu que algo sério acontecia. “Foi o ápice da confusão mental. Resultado de toda a pressão que eu me colocava. Toda a minha energia era só voltada para o trabalho. Aquilo foi criando um casulo”, disse. “Eu continuava ‘entregando’ (resultados), mas estava deprimida, cínica, pessimista, engordei 30 quilos e tinha dificuldade para delegar tarefas.”
O que Rafaela teve foi um esgotamento profissional, a síndrome de burnout – que será incluída na próxima revisão da Classificação Internacional de Doenças, segundo anúncio feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS) ontem. A lista, elaborada pelo órgão, tem por base as conclusões de especialistas de todo o mundo. A classificação é utilizada para estabelecer tendências e estatísticas de saúde. A nova versão da CID começa a valer em 2022.
Segundo pesquisa da IsmaBR (representante da International Stress Management Association), 72% dos brasileiros que estão no mercado de trabalho sofrem alguma sequela ocasionada pelo estresse. Desse total, 32% sofreriam de burnout. E 92% das pessoas com a síndrome continuariam trabalhando.
“Embora o burnout represente um nível exacerbado de estresse, as pessoas continuam em seus postos de trabalho pelo medo do desemprego. Um trabalhador nesse estado está mais propenso a cometer erros graves”, comentou a psicóloga e presidente do Isma-BR, Ana Maria Rossi.
Para ela, a decisão da OMS terá um efeito prático. “Pode dar um embasamento maior para os juízes decidirem questões trabalhistas relacionadas com a saúde mental.”
O burnout foi incluído no capítulo de “problemas associados” ao emprego ou ao desemprego e descrito como “uma síndrome resultante de um estresse crônico no trabalho que não foi administrado com êxito”.
Ele se caracteriza por três elementos: “sensação de esgotamento, cinismo ou sentimentos negativos relacionados a seu trabalho e eficácia profissional reduzida”. “Hoje (ontem) foi o dia mais feliz da minha vida”, disse a jornalista Izabella Camargo, já diagnosticada com burnout. “Isso (o reconhecimento) vai trazer mais entendimento e respeito para as pessoas que estiverem passando por isso”, completou a jornalista – que teria sido demitida da emissora que trabalhava após ser diagnosticada.
A médica e escritora Renata Corrêa apresentou os diversos sintomas do burnout. “Sou oftalmologista. Trabalhava em um clínica em que eu não vi a luz do sol. Uma vez, atendi 20 pacientes das 7h às 9h da manhã”, contou. “Neste dia, quando vi quantos pacientes em ainda tinha para atender, caí no choro e não consegui mais trabalhar”, completou.
Para o especialista em recursos humanos Marcelo Braga (fundador da Reachr), a pressão nas organizações e o ritmo de trabalho tem aumentado muito. “Com o reconhecimento da síndrome, os departamentos de RH vão precisar entender mais do tema. E contribuir para mudar essa cultura de que estresse oriundo do trabalho é apenas frescura”, completou.
O diretor dos ambulatórios do IPq (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas ), Rodrigo Martins Leite, disse que o reconhecimento da OMS deve representar uma mudança de cultura mesmo entre os profissionais. “Há 12 anos, tentei fazer uma pós-graduação em burnout, mas não pude porque a psiquiatria não aceitava esses diagnósticos.”
Fonte: Estadão
UGT - União Geral dos Trabalhadores