25/10/2018
Tem-se, com a Reforma, um novo parâmetro especial de jornada de trabalho marcado por regras prejudiciais ao trabalhador
1) Considerações Iniciais
Diante das tantas mudanças implementadas pela Lei 13.467/2017, há mais de um ano são traçadas reflexões no sentido de compatibilizar, de alguma forma, as novas regras à base principiológica do Direito do Trabalho, especialmente o princípio da proteção.
Assim, este artigo se propõe a refletir sobre o trabalho a tempo parcial e sua possível compatibilidade com referido princípio.
2) Trabalho a tempo parcial
Trabalho a tempo parcial, ao lado do turno ininterrupto de revezamento, é uma modalidade especial de duração do trabalho, pois há a definição de duração semanal máxima sem vinculação à duração diária máxima – 08 horas – prevista no art. 7o, inciso XIII, da CR/88.
Antes da Reforma Trabalhista, o trabalho a tempo parcial era aquele cuja duração semanal máxima do trabalho era de 25 horas, não sendo permitidas a realização de horas suplementares/horas extras. Ainda, o salário pago era proporcional à jornada, tendo como parâmetros empregados que exerciam, na empresa, as mesmas funções em tempo integral.
Em relação às férias, aplicavam-se as seguintes particularidades:
não podiam ser vendidas (abono pecuniário – venda de até 1/3);
não podiam ser fracionadas;
eram concedidas de acordo com o art. 130-A, da CLT.
Assim determinava o art. 130-A, da CLT:
Art. 130-A. Na modalidade do regime de tempo parcial, após cada período de doze meses de vigência do contrato de trabalho, o empregado terá direito a férias, na seguinte proporção:
I – dezoito dias, para a duração do trabalho semanal superior a vinte e duas horas, até vinte e cinco horas
II – dezesseis dias, para a duração do trabalho semanal superior a vinte horas, até vinte e duas horas;
III – quatorze dias, para a duração do trabalho semanal superior a quinze horas, até vinte horas;
IV – doze dias, para a duração do trabalho semanal superior a dez horas, até quinze horas;
V – dez dias, para a duração do trabalho semanal superior a cinco horas, até dez horas;
VI – oito dias, para a duração do trabalho semanal igual ou inferior a cinco horas.
Parágrafo único. O empregado contratado sob o regime de tempo parcial que tiver mais de sete faltas injustificadas ao longo do período aquisitivo terá o seu período de férias reduzido à metade.
Pela regra do artigo supracitado, os dias de férias a serem concedidos ao empregado contratado na modalidade de trabalho a tempo parcial dependiam do número de horas trabalhadas por semana, e não do número de ausências injustifcadas ocorridas no curso do período aquisitivo. Pela regra do parágrafo único, as ausências injustificadas afetavam o número de dias de férias apenas de superiores a 07. Se ultrapassado este limite, o período de férias seria reduzido pela metade.
Porém, com a Reforma Trabalhista, o trabalho a tempo parcial, regulamentado no artigo 58-A, da CLT, sofreu expressivas alterações tanto em relação ao parâmetro de duração semanal quanto em relação às férias. Quanto à duração semanal, com a nova redação do caput do art. 58-A, da CLT, vigoram dois parâmetros:
máximo 30 horas semanais, sem possibilidade de horas suplementares/horas extras;
máximo 26 horas semanais, com a possibilidade de até 06 horas suplementares/extras por semana;
no caso de prestação de serviços em caráter extraordinário (horas suplementares para quem for contratado para trabalhar até 26 horas semanais), será devido o adicional de, no mínimo, 50% do valor da hora normal de trabalho;
com a possibilidade de prestação de serviços extraordinários (para quem for contratado para trabalhar até 26 horas semanais), tornou-se possível a adoção do sistema de compensação de jornada, desde que com a observância das regras definidas no art. 59, da CLT.
Em relação às férias, destacam-se as seguintes mudanças:
possibilidade de venda de até 1/3 do período (abono pecuniário);
podem ser fracionadas;
serão concedidas de acordo com o art. 130, da CLT, uma vez que o art. 130-A foi revogado pela Lei 13.467/2017. O número de ausências injustificadas ocorridas no curso do período aquisitivo é requisito essencial para determinar o número de dias de férias a ser concedido ao empregado, e não mais o número de horas trabalhadas por semana. Assim determina o art. 130, da CLT, aplicado, pós-Reforma, também para os empregados contratados na modalidade de trabalho a tempo parcial:
Art. 130 – Após cada período de 12 (doze) meses de vigência do contrato de trabalho, o empregado terá direito a férias, na seguinte proporção:
I – 30 (trinta) dias corridos, quando não houver faltado ao serviço mais de 5 (cinco) vezes;
II – 24 (vinte e quatro) dias corridos, quando houver tido de 6 (seis) a 14 (quatorze) faltas;
III – 18 (dezoito) dias corridos, quando houver tido de 15 (quinze) a 23 (vinte e três) faltas;
IV – 12 (doze) dias corridos, quando houver tido de 24 (vinte e quatro) a 32 (trinta e duas) faltas.
§ 1º – É vedado descontar, do período de férias, as faltas do empregado ao serviço.
§ 2º – O período das férias será computado, para todos os efeitos, como tempo de serviço.
Reiterando: independentemente do número de horas trabalhadas por semana, se o empregado tiver até 05 ausências injustificadas no curso do período aquisitivo, serão garantidos a ele 30 dias corridos de férias, que podem ser fracionados, mediante acordo entre empregado e empregador, em até 03 períodos, um dos quais não poderá ser inferior a 14 dias corridos e os outros dois não poderão ser inferiores a 05 dias corridos cada um (art. 134, da CLT, pós-Reforma).
3) O princípio da proteção e o trabalho a tempo parcial
O Direito do Trabalho foi construído e deve ser interpretado sob o viés da protetividade, de forma a resguardar a parte que, em um contexto de acentuado desemprego, tem reduzido o seu potencial de negociar condições contratuais harmônicas e equilibradas.
Ao analisar as alterações feitas no instituto do trabalho a tempo parcial, percebem-se aspectos positivos e negativos. A padronização dos dias de férias a serem concedidos, em conformidade com a regra geral prevista no art. 130, da CLT, é, inegavelmente, uma alteração benéfica, pois houve um aumento considerável no parâmetro que, antes, estava condicionado ao número de horas trabalhadas por semana.
Consequentemente, serão aplicados os efeitos acessórios de fracionamento em até 03 períodos (dependendo do tipo de atividade exercida, o fracionamento pode não ser interessante ao trabalhador, sobretudo diante do direito à desconexão ao trabalho) e possibilidade de venda de até 1/3 do período (abono pecuniário).
Quanto à duração semanal, o legislador reformista perdeu a oportunidade de compatibilizar a regra ao parâmetro de duração diária definido na CR/88: máximo 08 horas. Em sentido contrário e fidedigno à essência flexibilizante e desconstrutivista do Direito do Trabalho, aumentou-se a possibilidade de explorar o trabalhador por, no máximo, 30 horas semanais (sem limitação de duração diária) ou, ainda, 26 horas semanais. Neste caso, serão permitidas até 06 horas suplementares por semana e, mais uma vez, sem limitação diária.
Ainda, uma vez possível a realização de horas suplementares, houve reconhecimento expresso da possibilidade de adoção do sistema de compensação de jornada, sendo este outro instituto bastante flexibilizado pela Reforma uma vez que poderá ser previsto em acordo individual – para compensação no prazo de, no máximo, 06 meses – ou, até mesmo, acordo tácito – para compensação dentro do mesmo mês1. Para o trabalhador contratado no regime de trabalho a tempo parcial, a compensação deverá ocorrer, no máximo, na semana imediatamente posterior à da prestação das horas suplementares.
Ademais, o legislador perdeu a possibilidade de definir, em rol taxativo, categorias cuja própria natureza do trabalho se compatibiliza com o trabalho a tempo parcial. Desta forma, qualquer empregado poderá estar sujeito à esta modalidade especial de duração semanal do trabalho com jornadas extensas e exaustivas.
Por fim, outra oportunidade perdida foi a de definir critério especial de pagamento de salário, já que o empregado poderá trabalhar até 30 horas consecutivas (respeitados os intervalos intrajornada) sem que se tenha, em contrapartida, um benefício pecuniário pela extensão da jornada. Ao contrário, foi mantida a possibilidade de pagamento do valor do salário-mínimo hora.
4) Considerações Finais
Considerando o Princípio da Proteção como pilar de sustentação do Direito do Trabalho, afirma-se que, de fato, a flexibilização trabalhista foi feita, especialmente em relação ao trabalho a tempo parcial, de forma a enfraquecer referido princípio. Portanto, tem-se, com a Reforma, um novo parâmetro especial de jornada de trabalho marcado por regras prejudiciais ao trabalhador (com exceção do instituto férias).
Espera-se que, na prática, sejam tomadas medidas pelos Órgãos competentes em matéria de fiscalização no trabalho no sentido de compatibilizá-lo à própria Constituição da República de 1988 e, dessa forma, promover o restabelecimento da base protetiva justrabalhista como mecanismo de promoção do trabalho enquanto valor de um Estado Democrático de Direito.
Fonte: Jota.info
UGT - União Geral dos Trabalhadores