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Juros de bancos não acompanham recuo na inadimplência


23/04/2018

Se tivesse respondido à queda dos juros básicos e ao recuo da inadimplência como no passado, a taxa média dos empréstimos ao consumidor no Brasil seria hoje 37,6% ao ano, 20 pontos percentuais abaixo dos 57,7% efetivamente cobrados em média.

 

Segundo o banco UBS, o descolamento ocorre a partir de 2014, quando o país entrou em recessão. Daí em diante, as duas variáveis consideradas cruciais para entender a dinâmica do crédito à pessoa física —o nível de calotes nos empréstimos e as oscilações do juro básico— deixam de explicar o comportamento das taxas ao consumidor.

 

"É brutal a diferença entre o que o modelo indica o que deveria ser a taxa cobrada, se ela tivesse se comportado como no passado, e o que ela é efetivamente", diz Tony Volpon, economista-chefe do UBS e ex-diretor do Banco Central.

 

O enigma da baixa reação dos juros à significativa queda recente da taxa Selic, quantificado por Volpon, está no centro do debate econômico nos últimos meses.

 

BC, instituições financeiras, economistas e advogados têm discutido as possíveis causas dessa distorção, que faz com que o spread —diferença entre o que os bancos pagam para captar recursos, que segue a Selic, e o que cobram para emprestá-los— no Brasil siga entre os mais altos do mundo.

 

Isso, a despeito de a Selic ter caído de 14,25% para 6,5% e de a inadimplência no crédito pessoal, mesmo considerada alta, ter atingido o piso da série mais recente.

 

A questão tem um tempero que a torna ainda mais intrincada: entre as empresas, a taxa média dos empréstimos reagiu às mudanças de juros, aos calotes e também à volatilidade da economia (componente importante para determinar os rumos do crédito corporativo), como o esperado, segundo os cálculos do UBS.

 

Ou seja, os fatores que estão impedindo a queda mais rápida dos juros pessoais não parecem atrapalhar na mesma medida o recuo das taxas corporativas, embora também pesem na sua composição.

 

Mesmo quando variáveis de risco são incorporadas ao modelo para a pessoa física, a conclusão é que o juro ao consumidor deveria estar ao redor de 43% (e não em 57%), o que mantém o mistério.

 

Especialistas concordam que as causas dos altos spreads no Brasil —e de sua queda lenta— são muitas, mas estão longe de um consenso sobre o tamanho da contribuição de cada uma para o problema.

 

Um ponto que tem sido debatido é a concentração bancária no Brasil. Segundo dados do Banco Mundial, os cinco maiores bancos brasileiros detinham 80,5% dos ativos do setor em 2015, mais que Chile (68%), Argentina (57,5%),China (52%) e EUA (46,5%).

 

Segundo o economista Sergio Werlang, da Fundação Getulio Vargas (FGV), isso ocorre porque a instituição bancária tem muito mais informações sobre seu cliente, como pontualidade no pagamento de contas e hábitos de consumo, do que os concorrentes.

 

"Isso permite que ela cobre juros maiores pois o cliente não mudará de banco já que o concorrente, que não o conhece, poderia cobrar uma taxa ainda maior", diz Werlang, que foi diretor do BC e vice-presidente do Itaú Unibanco.

 

Segundo Werlang, a competição bancária não é o único fator a contribuir para a margem alta de ganho dos bancos nos empréstimos bancários. A inadimplência, que caiu, mas continua relativamente alta, e os empréstimos compulsórios, volume que os bancos mantêm no Banco Central para regulação do sistema, também são fontes de pressão.

 

Isso não reduz a importância da concorrência bancária, já apontada como ponto de atenção no primeiro relatório sobre spread, em parte sob supervisão do próprio Werlang no fim da déca de 1990.

 

Luis Eduardo Assis, ex-diretor do BC e ex-executivo do HSBC, também aponta a baixa concorrência como causa da lentidão da queda do spread.

 

"Os bancos gostam de apontar impostos, o alto compulsório e a regulamentação bancária que onera a base de custos como justificativa, mas isto explica por que o spread é alto, e não por que ele não caiu", diz o ex-executivo do HSBC.

 

Nem sempre a concentração bancária elevada é sinônimo de baixa concorrência e juros altos. Há países como Canadá e Austrália, onde o volume de ativos nas mãos dos cinco maiores bancos é próximo ao visto no Brasil, mas os spreads são bem mais baixos.

 

"Há outros fatores que podem determinar um grau maior de concorrência mesmo em mercados concentrados, como a regulação do setor e a eficiência do judiciário", diz Márcio Issao Nakane, da USP.

 

No entanto, ele ressalta que, após a crise financeira global de 2008, tem ocorrido uma tendência de maior concentração bancária em vários países que parece estar sendo acompanhada por queda no nível de competição.

 

"Não posso afirmar isso com certeza, mas é uma percepção que tenho acompanhando os dados e a literatura internacional", diz Nakane.

 

Para Marcos Lisboa, presidente do Insper e um dos formuladores da Lei de Falências, a principal explicação para a queda lenta do spread não passa pela competição, mas por questões como a fatia ainda baixa de recuperação dos empréstimos inadimplentes.

 

"Além de a inadimplência ainda ser alta, continua difícil recuperar o montante não pago porque muitas decisões judiciais não seguem o estabelecido pela lei", diz Lisboa.

 

Gustavo Franco, que presidiu o Banco Central durante a década de 1990, diz que o tamanho do spread bancário no Brasil é assunto antigo, mas sempre adiado porque a taxa Selic era muito alta.

 

Para Franco, sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos, a obrigatoriedade de os bancos direcionarem recursos captados na poupança para o crédito imobiliário, em que os juros têm um teto, os levaria a buscar compensação —por meio de juros mais altos— em outros tipos de empréstimos.

 

Tony Volpon, do UBS, autor de estudo que indica que o juro ao consumidor seria mais baixo se tivesse acompanhado a trajetória de calotes e a queda da taxa Selic, sugere que os bancos podem simplesmente não querer aumentar a exposição ao crédito em meio a um cenário de recuperação econômica gradual.

 

Segundo especialistas, a criação do cadastro positivo (a lista dos bons pagadores, em análise no Congresso) seria um passo importante na queda dos spreads, assim como a entrada de novos concorrentes no sistema, como cooperativas e startups financeiras.

 

Por meio da associação do setor, a Febraban, os bancos dizem que o recuo do spread depende da redução do custo da inadimplência —não só dos calotes, mas dos custos associados à cobrança de dívidas e recuperação de garantias—, de custos operacionais (entre eles o trabalhista), tributários e regulatórios, e também dos lucros dos bancos. "A Selic afeta apenas indiretamente esses custos".

 

Os bancos dizem ainda que as taxas de juros dos empréstimos têm caído efetivamente. Nos recursos livres, a taxa, hoje em 57,7%, chegou a 74,33% em outubro de 2016.

 

O economista Edmar Bacha resume o imbróglio. "Como os preços dos carros e as contas dos celulares, os spreads bancários são mais um exemplo de nossos preços surreais".

 

Fonte: Folha de SP


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