24/10/2014
O presidente da CPI do Trabalho Escravo da Assembleia Legislativa de São Paulo estima que 12 mil oficinas clandestinas exploram a mão de obra de 200 mil imigrantes bolivianos. O relatório final da comissão, apresentado na quarta-feira (22), sugere medidas para acabar com a exploração da mão de obra. A construção civil ficou fora da investigação pode ser alvo de uma nova CPI.
Durante nove meses, os deputados investigaram fornecedores da indústria têxtil, inclusive de grifes famosas, que foram apontados como responsáveis pela exploração de imigrantes que trabalham em condições análogas às da escravidão.
Carlos Bezerra Júnior, que presidiu a CPI, explicou que as oficinas clandestinas onde os imigrantes bolivianos são explorados integram o terceiro e o quarto elo da cadeia de produção de roupas, o que dificulta vincular a exploração da mão-de-obra às etiquetas.
"As empresas já desenvolveram um grande talento para lidar com a opinião pública e trabalhar bem a própria defesa, mas ainda engatinham na prevenção dos contratos de trabalho escravo. Por isso, nós fizemos uma série de propostas por maior transparência e uma participação mais ativa do governo na questão", afirmou.
Para Bezerra Júnior, o trabalho escravo é um problema endêmico e resulta da ambição desenfreada. “Como a vantagem concorrencial de quem se utiliza desse tipo de prática dá em torno de 200% a mais de lucro, há necessidade de políticas públicas que protejam as pessoas em situação de vulnerabilidade", disse o presidente da CPI.
Nova fiscalização
Os deputados estaduais paulistas formularam uma lista de medidas a serem adotadas pelos três níveis de governo para dificultar o aliciamento e proteger os imigrantes. Eles requisitaram, por exemplo, que a Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo faça nova fiscalização nas empresas fiscalizadas nos últimos cinco anos e que o Ministério Público Federal investigue o envolvimento de todas as empresas envolvidas em possíveis redes de tráfico de pessoas ou possível aliciamento de trabalhadores.
Segundo as conclusões do relatório formulado pela deputada Leci Brandão (PCdoB), além da indústria têxtil, os deputados identificaram necessidade de investigação da construção civil e se sentiram obrigados a requerer a abertura de uma nova CPI para investigar os assuntos que não foram abordados em função do recesso e das eleições. Eles indicaram às empresas do setor que assinem o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Foram aprovadas 30 indicações, seis requerimentos, cinco projetos de lei, quatro recomendações à própria Assembleia Legislativa e 13 moções.
Veja algumas das principais indicações da CPI do Trabalho Escravo:
À Presidência da República e ao Congresso Nacional que ratifiquem a Convenção sobre Proteção dos Trabalhadores Migrantes e Membros de Sua Família, acordo da Organização das Nações Unidas (ONU) em vigor desde 2003 e do qual o Brasil é o único país do Mercosul não signatário.
À Polícia Federal que realize em todos os controles de fronteira, aéreos e terrestres, o registro dos dados completos das pessoas e que esses dados sejam disponibilizados em sistema nacional de banco de dados compartilhados com outras instituições públicas. Segundo Bezerra, nas fronteiras ocorre apenas o carimbo do passaporte.
Ao Ministério do Trabalho, que agilize a confecção das carteiras de trabalho de estrangeiros. Segundo o deputado, há locais em que o imigrante aguarda até seis meses a confecção do documento e a demora torna as pessoas vulneráveis.
Ao Ministério das Relações Exteriores, a CPI indicou a necessidade de estabelecer junto ao governo boliviano compromisso de combater a propaganda enganosa na Bolívia que alicia trabalhadores para o mercado clandestino em São Paulo. Segundo o deputado, atualmente há anúncios em jornais e locais públicos de cidades bolivianas oferecendo condições de trabalho enganosas.
À Polícia Federal, ao Ministério da Justiça e à Presidência da República providências para fazer cumprir efetivamente regras para embarque de crianças em viagens internacionais determinadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Segundo Bezerra, as fronteiras são extremamente porosas nas viagens terrestres.
Ao governo do estado de São Paulo, a necessidade de criação de grupo interdisciplinar para estabelecer política de contratação de empresas terceirizadas no setor de confecções. O grupo teria participação também da Assembleia Legislativa, do Ministério do Trabalho e procuradorias regionais do trabalho. O objetivo é eliminar o trabalho escravo na cadeia produtiva
Ao governo de São Paulo, a CPI indicou também maiores investimentos na delegacia de repressão aos crimes contra a liberdade pessoal do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Segundo a CPI, essa delegacia conta com apenas 12 policiais, entre escrivães e investigadores.
Projetos de lei
Autor do projeto que deu origem à lei 14.496/2013, que pune empresas exploradoras do trabalho escravo, Bezerra propôs um pacote de projetos de lei: criação de uma política uniformizada de atendimento a vítimas de trabalho escravo no estado, para impedir a simples deportação das vítimas de exploração; criação de um sistema de fomento de cooperativas de imigrantes direcionado a reunir os trabalhadores da indústria da confecção; criação de microcrédito para cooperativas de imigrantes na cadeia produtiva da confecção em São Paulo e criação de incentivos para empresas da área têxtil que comprovarem a idoneidade de sua cadeia produtiva livre de trabalho escravo nas oficinas terceirizadas e quarteirizadas.
Fonte: G1
UGT - União Geral dos Trabalhadores