14/10/2014
Um menino debilitado, de olhar caído e coberto de feridas da cabeça aos pés hipnotizou o servidor público Mauro Bezerra, 49, durante uma visita a um abrigo de Garanhuns (a 232 km do Recife).
Foi ali que ele decidiu: João (nome fictício) seria seu primeiro filho e teria os mesmos direitos de qualquer outra criança adotada no país.
Onze meses depois, o garoto de quatro anos ganhava um sobrenome e uma casa.
Mas o pai, que é solteiro, queria mais do que ter um filho. Ele queria criá-lo.
Depois de ter o pedido negado pela Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), onde trabalha há 20 anos, decidiu recorrer à Justiça para obter licença remunerada de 180 dias.
"Nunca tinha tempo para conhecer o meu filho, trabalhava o dia inteiro. Quando o pegava na escola, ele já estava dormindo. Continuávamos dois estranhos dentro de casa", conta.
Como servidor público, Bezerra está submetido a uma lei que concede período de afastamento só às mães.
Os pais ganham no máximo cinco dias de licença.
Em paralelo à lei, no entanto, a Justiça já havia concedido os 180 dias de licença a mães solteiras e casais homoafetivos que adotavam crianças recém-nascidas.
Para o caso de Bezerra, pai solteiro de uma criança que já não era mais recém-nascida, não havia jurisprudência.
"A lei ainda acha que apenas o recém-nascido adotado precisa de maior cuidado e se esquece daquele que é adotado tardiamente. João carregava traumas da rejeição, de uma família desestruturada", disse Leilane Mara, advogada do servidor.
Desde 30 de setembro, ele é o primeiro servidor solteiro no país a conquistar esse benefício na Justiça federal.
O juiz federal Bernardo Ferraz, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), afirma que concedeu a liminar amparado pela Constituição.
"Não se pode diferenciar filhos adotivos dos biológicos. Nesse caso, o servidor é pai e mãe do menor e é dele que vem toda a dedicação a essa criança", afirmou.
"Eu sabia que o direito do João existia. E fui atrás. Esses seis meses não são para mim, mas para a criança. Eu acho que o nome do benefício deveria mudar de licença-maternidade para licença-infância", diz o pai.
Com mais tempo para João, o servidor público diz que o filho é outra criança.
"O João está mais calmo, consegue socializar bem com os colegas da escola. Hoje já me chama de pai", diz.
No futuro próximo, o servidor prevê aumentar a família, com um irmão mais novo para João. Mas, antes, diz o servidor, um desafio precisa ser superado. "Eu adotei o João ali, naquele primeiro encontro. Agora, preciso ser adotado como pai."
Fonte: Uol
UGT - União Geral dos Trabalhadores