05/03/2013
Governo prevê gasto de R$ 2,8 bi com MP de Basileia
O governo prevê gastar, nos próximos três anos, R$ 2,844 bilhões em decorrência da Medida Provisória nº 608. O texto permite devolver aos bancos, em determinadas situações, tributos que foram cobrados sobre o valor de provisões constituídas para risco de inadimplência de tomadores de empréstimo, dando origem a créditos tributários.
Estima-se a criação de despesas obrigatórias de caráter continuado" da ordem de R$ 851 milhões em 2014
de R$ 945 milhões em 2015, e, de R$ 1,048 bilhão em 2016, informa o texto da exposição de motivos da MP, disponibilizado somente no fim de semana. A divulgação da estimativa, quando há impacto fiscal, é exigida pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
O ressarcimento autorizado pode ser em espécie ou em títulos da dívida pública e é restrito a algumas situações. É o caso de falência ou de liquidação extrajudicial da instituição financeira, hipóteses em que a massa falida ganharia recursos para pagar os credores.
Entre aquelas que têm o tipo de crédito tributário em questão, também poderão se beneficiar instituições em funcionamento normal, desde que apresentem "saldo de prejuízo fiscal acumulado no ano-calendário anterior", diz o texto da medida, editada na sexta-feira.
Os bancos em geral precisam provisionar grandes volumes para risco de calote. Isso ocorre não só porque emprestar dinheiro é o seu principal negócio. Ocorre também porque as regras prudenciais exigem que sejam constituídas provisões inclusive para empréstimos e financiamentos em situação normal de pagamento, a partir de uma nota de classificação de risco atribuída a cada tomador de crédito. Assim, a ampliação da carteira de operações por si só demanda novas provisões.
Na apuração do lucro contábil, todo aumento líquido de provisões representa despesa. O mesmo não se aplica, porém, na apuração da base de incidência do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A Receita Federal só reconhece a despesa, permitindo que ela reduza o lucro tributável, quando o tomador do empréstimo ou financiamento bancário está efetivamente inadimplente e mesmo assim depois de esgotados determinados procedimentos de cobrança. Essa diferença de tratamento provoca incidência de tributos sobre despesa contábil e, por consequência, registro de créditos tributários no ativo dos bancos.
Aos olhos do Banco Central (BC), esses são ativos difíceis de realizar, uma vez que isso só ocorre quando as operações que lhes deram origem são consideradas incobráveis pelos critérios da Receita Federal. Por isso, a autoridade monetária queria que os créditos tributários relativos a provisões para risco de calote fossem excluídos do ativo dos bancos para efeitos de cálculo do patrimônio de referência (PR), medida de capital regulamentar usada no Brasil.
A exclusão estava prevista na proposta original do BC para o ajuste das normas do país ao novo acordo internacional sobre exigências de capital mínimo e regras prudenciais aplicáveis a instituições financeiras. Conhecido como Basileia 3, o acordo consiste num conjunto de recomendações prudenciais aprovado no fim de 2010 pelo comitê de autoridades de supervisão bancária que se reúne regularmente em Basileia, na Suíça, entre elas o BC brasileiro. Foi uma reação à crise que afetou bancos no mundo inteiro em 2008/2009, nascida de problemas no mercado de crédito imobiliário americano.
Os banqueiros foram ao governo reclamar, pois a exclusão dos referidos créditos tributários causaria redução em torno de R$ 60 bilhões no PR consolidado do sistema bancário do Brasil. O valor do PR limita o volume de crédito que um banco pode conceder e, se há algo que o governo não quer, é retração do crédito. A saída para o impasse saiu de uma negociação concluída quase na virada de 2012 para 2013 e cuja formatação legal atrasou em dois meses a aprovação das normas que ajustam o arcabouço regulatório do Brasil para Basileia 3. Em troca de uma mudança na posição do BC sobre a questão, o Ministério da Fazenda topou garantir a realização de créditos tributários oriundos de provisões para risco de inadimplência nas situações que depois foram contempladas pela MP 608, mesmo que isso tenha custo para os cofres públicos.
Assim, o BC concordou que tais créditos tributários continuem no cálculo do capital mínimo exigido. Por proposta do BC, o Conselho Monetário Nacional (CMN) mandou abater, do cálculo do PR, somente outros tipos de crédito tributário que não os relativos a provisões - e mesmo assim nem tudo (90%).
A MP nº 608 permite converter os créditos tributários de provisão em crédito presumido para que possam ser ressarcidos. Na sexta-feira, a Fazenda informou que, no caso de instituições em funcionamento normal, o critério para pedir ressarcimento é ter apurado prejuízo fiscal no ano anterior, ou seja, base negativa de tributação sobre lucro. O texto da exposição de motivos, por sua vez, diz que as instituições poderão apurar o crédito presumido "em cada período de apuração fiscal, quando apresentarem prejuízo fiscal apurado no período de apuração anterior".
Porém, do jeito que foi escrito, o inciso II do artigo 2º da MP deu margem a outra interpretação porque referiu-se a saldo. Numa análise preliminar, a equipe do BRB, banco estatal controlado pelo Distrito Federal, por exemplo, entende que a condição para se beneficiar da medida é ter saldo de prejuízo fiscal no ano anterior e não necessariamente gerado no ano anterior, disse o diretor financeiro da instituição, Francisco Cláudio Duda.
Ele explicou que a legislação permite que prejuízos fiscais sejam abatidos de lucros fiscais de anos subsequentes. Mas, além de sujeita a restrições (até 30% do lucro), essa compensação não tem prazo para ser concluída. Assim, uma instituição financeira pode registrar, em determinado ano, saldo de prejuízo fiscal decorrente de prejuízos fiscais passados e não necessariamente do próprio ano. De acordo com esse entendimento, a MP beneficiaria, por exemplo, a financeira do BRB, que ainda não conseguiu zerar o saldo de prejuízo fiscal apurado em 2009.
Fonte: Valor Econômico"
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