26/05/2010
A União Geral dos Trabalhadores (UGT) acaba de lançar, em livro e DVD, um balanço histórico e uma avaliação dos desafios do sindicalismo brasileiro na atualidade. Elaborado para o seminário nacional da entidade, ocorrido na quinta-feira 20, o projeto 100 anos de Movimento Sindical no Brasil" reúne uma série de artigos e entrevistas com pensadores e representantes da central sindical. Em entrevista a CartaCapital, Ricardo Patah, presidente da UGT, sustenta que o sindicalismo deve ir além da luta por melhores salários e condições de trabalho. "É preciso identificar as necessidades do trabalhador como cidadão e incluí-los nas políticas públicas", afirma.
CartaCapital: Qual é o principal desafio do sindicalismo brasileiro no século XXI?
Ricardo Patah: O sindicalismo é um movimento social. E, como todo movimento, ele tem as suas alterações, para cima ou para baixo. O sindicalismo nos idos do século passado, especialmente até a década de 70, teve um dos seus momentos mais gloriosos. Ele conseguiu encantar a sociedade. De lá para cá, houve um certo acomodamento. Por isso, digo que a UGT nasceu num momento muito adequado, há três anos, com essa proposta de quebrar paradigmas, de buscar atender às necessidades dos trabalhadores enquanto cidadão. O objetivo é incluí-lo nas políticas públicas que vão ao encontro da educação, da saúde, dos direitos essenciais. Temos exemplos clássicos, como aquela fila de pessoas picadas pelo mosquito da Dengue no Rio de Janeiro há alguns anos e muitas delas já estavam com o destino traçado, que era a morte. Porque há uma diferença muito grande na qualidade de atendimento à população de baixa renda, composta majoritariamente pelos trabalhadores. Então, temos de garantir uma saúde melhor. E não apenas isso, buscar atender outras necessidades e voltar a encantar a classe trabalhadora.
CC: Isto é, ir além da defesa por melhores condições de trabalho e por salários maiores...
RP: Essas são atividades intrínsecas e necessárias do movimento sindical. Mas nós também podemos pressionar as estruturas oficiais do Brasil, para que o atendimento das políticas públicas seja melhorado em todo o país, especialmente a educação. O desafio mais importante para o sindicalismo é tentar ler e traduzir as necessidades que a classe trabalhadora está sinalizando, para que possamos ter esse compromisso e cumplicidade.
CC: A UGT fala em sindicalismo de idéias, intelectual. O que é exatamente isso?
RP: Na realidade, falado dessa forma, parece até uma elitização do sindicalismo. O que queremos buscar é a inclusão dos trabalhadores. É por isso que batemos sempre na tecla de que a qualificação dos trabalhadores é necessária, além de ser um dos principais gargalos para o nosso crescimento. Queremos que o trabalhador tenha condições de raciocinar, de pensar, de estar incluído nas transformações políticas do país. Não queremos ver o trabalhador apenas na platéia, aplaudindo ou vaiando. Quem vota são os trabalhadores, que são muito bem tratados nas eleições. Fala-se agora em aumento das aposentadorias, ficha limpa, ano eleitoral é uma beleza. Mas queremos participar ativamente nas mudanças que passa o nosso país e contribuir para a diminuição do fosso que separa as classes sociais. Porque 1% da nossa população tem metade da riqueza do Brasil e todo o resto divide o restante, incluindo toda a pobreza existente no Brasil.
CC: Lula fez mais bem ou mal ao sindicalismo brasileiro?
RP: Ele foi o melhor presidente que já tivemos até hoje. Resgatou da miséria 30 milhões de brasileiros, deu um indicativo importante para que o salário mínimo voltasse a ter poder de compra, vetou a flexibilização das relações entre capital e trabalho. Ele tem os seus méritos. Ao mesmo tempo, nós cobramos muitas outras coisas, como a questão da educação. Ainda temos no Pará a figura do estudante jacaré, que é obrigado a assistir às aulas deitado no chão porque não tem nem cadeira para estudar. Caímos 12 posições no ranking de educação da Unesco. Temos a questão dos elevados juros. Hoje, são 2,2 trilhões de reais de dívida interna, com certeza por causa dos juros elevados e dos recursos alocados pelo BNDES para fusões.
CC: Como conquistar essa nova classe média que emerge no Brasil?
RP: O movimento sindical tem de ter a capacidade de ouvir as próprias bases. As centrais têm de ouvir os sindicatos, que, por sua vez, têm de ouvir seus trabalhadores e trabalhadoras. Infelizmente, hoje, e há pesquisas que mostram isso, o trabalhador anda muito distante dos sindicatos. O movimento sindical tem suas responsabilidades. Conseguimos aumentos salariais importantes, mas não podemos ficar só nisso.
CC: Por que a UGT é a favor da redução da jornada de trabalho?
RP: Em 1988, quando reduziu-se a jornada de 48 horas semanais para 44, já era para reduzir para 40. Mas optaram por uma proposta salomônica. Essa é uma luta histórica do movimento sindical. Segundo aspecto diz respeito à tecnologia, que tem oferecido mais saúde, mais conforto à população. Só que, no mundo do trabalho, essa tecnologia desempregou demais. Os bancários, que eram 1 milhão de trabalhadores, hoje são 400 mil. E foi a tecnologia que expeliu os trabalhadores dessa área. No caso da indústria automobilística, temos o exemplo da Volkswagen, que tinha, nos anos 70, cerca de 44 mil trabalhadores numa única planta em São Bernardo. Hoje, a empresa tem cinco ou seis plantas pelo Brasil, com 13 mil trabalhadores, e produz seis vezes mais automóveis que naquela época. A redução da jornada de trabalho traria, segundo o Dieese, 2,5 milhões de trabalhadores para o mundo laboral. Além disso, com a redução da jornada, o trabalhador teria mais tempo para investir na sua própria qualificação. E o custo disso é pequeno e será compensado com o consumo desses trabalhadores incluídos.
Rodrigo Martins - Exclusivo para Carta Capital"
UGT - União Geral dos Trabalhadores