19/02/2010
A sobrevida dos pacientes de aids das regiões Sul e Sudeste dobrou entre 1995 e 2007. O tempo médio de sobrevida saltou de 58 meses para mais de 108 meses no período. Estudo encomendado pelo Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde acompanhou cerca de dois mil adultos diagnosticados entre 1998 e 1999. Mais da metade deles (60%) continuaram vivos por, no mínimo, 108 meses depois do diagnóstico. Pesquisa semelhante feita com outro grupo de pacientes diagnosticados entre 1995 e 1996 apontou que metade desses permanecia viva por apenas 58 meses após a confirmação da doença.
Os dados fazem parte do Estudo de Sobrevida de Pacientes de Aids no Brasil, cujo resumo será publicado juntamente com o Boletim Epidemiológico Aids/DST 2008. O documento será lançado no dia 25 de novembro em Brasília. O estudo foi realizado em 23 cidades do Sul e Sudeste do país. No período do diagnóstico, as duas regiões concentravam 82,4% da epidemia brasileira.
Estudo de sobrevida em adultos
Período de Diagnóstico1995-19961998-1999
Último ano de acompanhamento20002007
Sobrevida58 meses*> 108 meses**
*Marins et al., 2002.
** Guibu, I et al. No prelo. Adultos diagnosticados entre 1998 e 1999 nas regiões Sul e Sudeste (82,4% do total de casos diagnosticados no Brasil nesse período). Não se atingiu a mediana de toda a amostra, pois até nove anos de observação, 59,4% dos pacientes estavam vivos.
De acordo com o estudo realizado em 2007, o diagnóstico precoce, seguido do acesso a medicamentos anti-retrovirais e do acompanhamento clínico adequado contribuíram para aumentar a sobrevida dos pacientes. A pesquisa apontou ainda que:
- o uso de medicamentos anti-retrovirais tem impacto positivo no tempo de vida após o diagnóstico
- pacientes diagnosticados ainda assintomáticos têm maior sobrevida que aqueles que já desenvolveram doenças oportunistas
- pacientes de maior escolaridade (níveis médio e superior) vivem mais
- mulheres têm maior sobrevida
- os infectados por via sexual vivem mais que os expostos ao vírus por uso de drogas injetáveis
- o desenvolvimento de tuberculose contribui para a redução da sobrevida (a tuberculose é hoje a doença associada ao HIV que mais mata)
- aqueles que fizeram profilaxia de pneumocistose (pneumonia potencialmente grave) vivem mais tempo.
Na opinião da diretora do Programa Nacional de DST e Aids, Mariângela Simão, o mais importante é que as diversas intervenções adotadas ao longo dos anos potencializaram o impacto do programa brasileiro. Os resultados dos estudos de sobrevida são uma prova disso. Países como o Brasil, que optaram pelo acesso universal ao tratamento na década de 1990, determinaram a mudança na história natural da doença. Em pouco mais de dez anos, a aids deixou de ser uma sentença de morte", afirma.
Além da oferta universal da terapia anti-retroviral de alta potência, garantida por lei a partir de 1996, a estruturação do sistema de saúde foi fundamental para melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem com aids. Os testes de carga viral e CD4, por exemplo, permitem reconhecer ao longo do acompanhamento a falha do esquema terapêutico antes que o paciente apresente doenças oportunistas. Hoje, 83 laboratórios oferecem esses exames em todos os estados do país e no Distrito Federal. O Programa Nacional de DST e Aids enviou para 600 mil testes para carga viral e outros 600 mil para contagem de células CD4 para distribuir entre os laboratórios em 2008.
Outra contribuição importante para a boa resposta ao tratamento é a implantação da Rede Nacional de Genotipagem, que realiza testes para detectar a resistência do HIV aos medicamentos. Disponíveis na rede de saúde desde 2001, esses exames indicam a quais drogas o vírus está resistente, possibilitando a estruturação do novo esquema de tratamento. Quando é detectada resistência, o médico responsável pelo acompanhamento indica outra combinação de remédios, com o objetivo de controlar a replicação viral e preservar a condição imunológica.
Os "esquemas de resgate" estruturam-se pela combinação de anti-retrovirais ainda ativos contra o vírus. Daí a importância de ter incluído, ao longo dos anos, novas classes de anti-retrovirais no arsenal terapêutico oferecido pelo governo brasileiro.
No início da década de 1990, o tratamento estava baseado apenas na administração do AZT (zidovidina). Atualmente, 18 anti-retrovirais são fornecidos pelo Ministério da Saúde. A última incorporação foi feita em outubro deste ano. O Raltegravir faz parte de uma nova classe de medicamentos, indicado para quem já desenvolveu resistência às outras classes disponíveis. Estima-se que em 2009 cerca de mil pacientes se beneficiarão do novo medicamento.
Até o fim deste ano, estima-se que 185 mil adultos estejam em tratamento. Para assegurar o acesso universal à terapia no país, será investido cerca de R$ 1 bilhão.
Desafios - Mariângela Simão lembra ainda que é preciso enfrentar desafios importantes para melhorar a qualidade de vida e aumentar ainda mais a sobrevida dos pacientes de aids. "Afinal, mesmo com todos esses avanços, ainda não há perspectiva de cura", destaca a diretora do PNDST/AIDS.
Ela enumera quatro pontos fundamentais para direcionar o enfrentamento da epidemia. O primeiro deles é a ampliação do diagnóstico precoce. Hoje, mais da metade das confirmações da doença são feitas quando já existe importante deterioração imunológica .
Depois do diagnóstico estabelecido, é preciso cuidar do acompanhamento clínico. A resistência do vírus aos medicamentos pode ser evitada pela boa adesão ao tratamento. As ações para melhorar a resposta às co-infecções do HIV com tuberculose e hepatites virais são outra prioridade. A primeira, por exemplo, é a doença associada à aids que mais mata. Já as hepatites, quando associadas ao vírus da aids, apresentam maior risco de progressão para cirrose hepática e maior mortalidade.
Por fim, ainda é preciso fortalecer a resposta dos serviços de saúde aos efeitos adversos do tratamento, incluindo incentivo a um estilo de vida saudável (alimentação adequada e atividade física), prevenindo a ocorrência de doenças cardiovasculares e da lipodistrofia.
Apesar da melhor condição de vida de quem tem aids, o tratamento, muitas vezes, exige esforço do paciente, já que, para alguns, é preciso conviver com efeitos adversos importantes. Por causa disso - afirma ela - é importante não descuidar da prevenção de novas infecções. "E até o momento, o uso do preservativo é a forma mais eficaz para evitar a exposição ao HIV", diz.
Sobrevivência de crianças - A chance de sobrevivência de crianças menores de 13 anos que vivem com aids aumentou substancialmente desde o início da epidemia. O estudo "Ampliação da sobrevivência de crianças com Aids: uma resposta brasileira sustentável" mostra que a probabilidade de uma criança diagnosticada na década de 1980 tinha cerca de 25% de chance de estar viva após 60 meses. As diagnosticadas no período 1999-2002 (depois da introdução de TARV) tinham cerca de 86% (veja tabela).
Ao todo, foram acompanhadas 2,1 mil crianças dos 26 estados e do Distrito Federal em diferentes estudos. O objetivo foi determinar a mediana de sobrevida (tempo em que 50% dos pacientes estão vivos) para o grupo. Em 2007, nove anos depois, 85% das investigadas no último estudo continuavam vivas. "É um sinal de que a propabilidade de sobrevivência tende a crescer ainda mais", afirma Mariângela Simão. Os dados serão apresentados no Boletim Epidemiológico Aids/DST, a ser divulgado nesta terça-feira, dia 25 de novembro, em Brasília (veja serviço).
Ano-DiagnósticoNúmero de CasosProbabilidade de sobrevivência em 60 meses (%)
Antes de 1988*6624,6
1988 a 1992*37832,9
1993 a 1994*23247,3
1995 a 1996*24658,3
1997 a 1998*23260,5
1999 a 2002**94586,3
* Matida et al., 2002. Crianças diagnosticadas no período 1983 a1998, e que entraram no sistema até 31 de Dezembro de 2000.
** Matida et al. Dados em revisão. Crianças diagnosticadas entre 1999 e 2002 e acompanhadas até 2007. Não se atingiu a mediana de toda a amostra, pois até nove anos de observação, 85% dos pacientes estavam vivos.
Boletim epidemiológico confirma maior sobrevida em adultos
Dados gerais - Os dados do novo Boletim Epidemiológico Aids/DST mostram que, de 1980 a junho de 2008*, foram registrados 506.499 casos de aids no Brasil. Durante esses anos, 205.409 mortes ocorreram em decorrência doença. A epidemia no país é considerada estável. A média de casos anual entre 2000 e 2006 é de 35.384. Em relação ao HIV, a estimativa é de que existam 630 mil pessoas infectadas.
Do acumulado, a região Sudeste é a que tem o maior percentual de notificações - 60,4% - ou seja 305.725 casos. O Sul concentra 18,9% (95.552), o Nordeste 11,5% (58.348), o Centro-Oeste 5,7% (28.719) e o Norte 3,6% (18.155).
Percentual acumulado de notificações da aids por região - 1980 a 2008*
Centro-Oeste5,7% (28.719)
Nordeste11,5% (58."
UGT - União Geral dos Trabalhadores