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Denúncias sobre trabalho escravo atingem recorde em 2008


04/05/2009

Amazônia concentra 72% de assassinatos no campo, mostra CPT

Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) apontam que 72% dos assassinatos em conflitos no campo em 2008 ocorreram na Amazônia. O índice se refere a disputas pelo acesso à terra e à água, além de casos de trabalho escravo. O relatório anual Conflitos no Campo Brasil 2008" foi divulgado durante a 47ª Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Indaiatuba (SP), cidade do interior paulista. O encontro começou no dia 22 de abril e termina nesta sexta (1º).

"Houve um avanço da cana-de-açúcar em Goiás, Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais. A cana está substituindo áreas de pastagem e o gado está indo para a fronteira agrícola. Isso antecipa a ação do grileiro, que vai na frente", explica o geógrafo Carlos Walter Porto-Gonçalves, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Entre as principais consequências desse processo, está a apropriação ilegal de terras públicas, a expulsão de populações tradicionais e o aumento da violência. Outro efeito imediato foi o recorde histórico de denúncias sobre o uso de mão-de-obra escrava.

No ano passado, houve 28 mortes por conflitos no campo - 20 delas na Amazônia Legal, que corresponde à totalidade do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do Maranhão. No total, 1.170 conflitos agrários foram registrados, uma redução de 23% em comparação a 2007. O relatório da CPT, que passou a ser publicado de forma sistemática em 1985, cita ainda 44 tentativas de assasssinato, 90 ameaças de morte, 168 prisões e 800 agressões. Esse é o principal levantamento no país sobre casos de violência ocorridos na zona rural.

O número total de pessoas assassinadas se manteve igual ao índice verificado em 2007 (28). No entanto, um dos aspectos negativos fica por conta do Pará - de 5 mortes em 2007 saltou para 13 em 2008. Outros três estados tiveram aumento no número de assassinatos: Bahia, Rondônia e Rio Grande do Sul. Houve uma morte para cada 54 conflitos no país em 2007. Já em 2008, a proporção foi de um homicídio para cada 42 ocorrências.

As principais vítimas dos confrontos são as populações tradicionais, que envolvem indígenas, quilombolas, posseiros, ribeirinhos e camponeses. Em 2007, eles representavam 41% dos envolvidos nesses conflitos - são agora 53% do total. Os sem-terra, que ocupavam o primeiro lugar em 2007, caíram de 44% para 36%. Carlos Walter, que é professor da UFF e elabora análises para o relatório da CPT desde o ano de 2003, afirma que essas comunidades estão sendo "expropriadas". "São ocupantes históricos que não detêm a titulariedade jurídica das terras", complementa.

O levantamento da CPT avalia que esse cenário de vulnerabilidade das populações tradicionais tende a se agravar num contexto de expansão desenfreada da fronteira agrícola e do agronegócio. Além disso, há diversas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como a reforma da rodovia BR-319 - que liga Porto Velho a Manaus -, além da chegada de investidores estrangeiros no comércio de terras, que podem ser indicativos de mais pressão sobre essas comunidades, muitas delas localizadas em áreas de mananciais e florestas ricas em biodiversidade.

O bispo emérito de Goiás dom Tomás Balduino, um dos fundadores da CPT em 1975 e ex-presidente da entidade (1999-2005), argumenta que as políticas voltadas ao campo não estão contribuindo para reverter esse cenário. Ele diz que o governo federal não direciona recursos à reforma agrária nem realiza as desapropriações. "Os índices de atualização da produtividade são da década de 1970", lamenta. "Há uma política antirreforma agrária que retrocede ao Brasil exportador de matéria-prima".

A CPT elegeu no último dia 18 de abril a sua nova coordenação nacional para o próximo triênio (2009-2011). Dom Ladislau Biernaski, bispo de São José dos Pinhais (PR), foi escolhido presidente da entidade. Ele substituiu dom Xavier Gilles de Maupeou d`Ableiges, bispo de Viana (MA). Dom Tomás Balduino permanece como conselheiro permanente da CPT.

Impunidade

O caso Dorothy Stang foi lembrado como um dos principais símbolos da impunidade no campo. A missionária norte-americana naturalizada brasileira foi assassinada com seis tiros - um deles na nuca - aos 73 anos, em fevereiro de 2005. Ela foi alvejada numa estrada vicinal de Anapu (PA). Dorothy defendia os Programas de Desenvolvimento Sustentável (PDSs) como modelo de reforma agrária e de fixação das famílias na Amazônia.

No último dia 22 de abril, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão liminar, mandou soltar Vitalmiro Bastos de Moura (Bida), acusado de ser um dos mandantes do crime. Bida, que teve o seu julgamento anulado pelo Tribunal de Justiça do Pará (TJ-PA), estava detido desde o início do mês. Ele e o pistoleiro Rayfran das Neves (Fogoió) serão julgados novamente. Seu cúmplice Clodoaldo Batista (Eduardo) cumpre pena de 17 anos de prisão. Já o intermediário Amair da Cunha (Tato) foi condenado a 18 anos de reclusão.

O fazendeiro Regivaldo Pereira Galvão, o "Taradão", outro acusado pelo crime de mando, deve ir a júri neste semestre. Essa é a promessa pública feita pelo desembargador Rômulo Nunes, presidente do TJ do Pará, que assumiu o cargo em fevereiro deste ano. Se não for possível agendar o julgamento até junho, Rômulo assumiu o compromisso de fazê-lo até o final de 2009.

Quatro anos após a morte de Dorothy, o Pará continua na liderança do ranking no número de conflitos (245), assassinatos (13), ameaças de morte (35), famílias expulsas (740) e despejos (2051). "A impunidade favorece o avanço da criminalização dos movimentos socias e da violência no campo", afirma o padre Dirceu Luiz Fumagalli, membro da coordenação nacional da CPT.

Criminalização

A principal pressão contra os movimentos sociais em 2008 veio do Poder Judiciário. Em junho do ano passado, o Conselho Superior do Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul chegou a pedir a "dissolução" do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O promotor Gilberto Thums foi o responsável por uma ação civil pública que tentou declarar o MST "ilegal" (confira matéria). Denúncias foram encaminhadas à Organização das Nações Unidas (ONU) contra a criminalização dos movimentos sociais.

Segundo o documento da CPT, a atitude do MP gaúcho "abriu as portas" para outras ações conjuntas entre o Judiciário e o governo estadual. O relatório diz que as políticas de "repressão" adotadas geraram um "efeito Yeda" - em referência à governadora Yeda Crusius (PSDB). Os dados apontam um recrudescimento generalizado da violência rural no estado. Houve aumento no número de conflitos (de 32 para 33), famílias envolvidas (3.875 para 4.934), despejos (940 a 1.954), expulsões (0 a 60), prisões (15 a 19), agressões (54 a 328), ameaças (1 a 3) e assassinatos (0 a 2).

Neste mês, porém, o Pará voltou a estar em evidência. Um conflito entre os acampados da fazenda Espírito Santo e "seguranças" da Agropecuária Santa Bárbara, que tem o banqueiro Daniel Dantas entre os proprietários, deixou nove feridos a bala - oito sem-terra e um funcionário da empresa - em Xinguara, a 792 km de Belém. A ação gerou polêmica após uma denúncia não-comprovada de que integrantes do movimento teriam mantido quatro jornalistas como "reféns" durante o enfrentamento. O MST nega a acusação.

Durante o lançamento do balanço da CPT, dom Tomás Balduino teceu comentários sobre o que vem ocorrendo no Pará. "São provocações do lado dos latifundiários que chegam ao ponto da explosão. É uma situação de profissionais da provocação. O pessoal da base não é de fazer violência. Eles se defendem. Mas quando acontece isso quem sai com a imagem danificada são os trabalhadores rurais. Eles são considerados agressores".

Por Maurício Reimberg

ACESSE E ASSINE o abaixo-assinado pela aprovação da PEC do Trabalho Escravo. A UGT - União Geral dos Trabalhadores, integra o movimento.

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