07/06/2018
Clientes que desistirem da compra de um imóvel negociado na planta terão de pagar até 50% do valor já dado à construtora como multa para se desfazer do negócio. O valor só não será pago se o consumidor encontrar interessado que aceite a transferência de toda a dívida do imóvel. Casos julgados na Justiça nos últimos anos previam retenção bem menor nesses casos: de 10% a 25% como multa.
Após tramitar por mais de três anos na Câmara, deputados aprovaram nesta quarta-feira, 06, novas regras para a devolução de imóveis comprados na planta. O chamado “distrato” pode acontecer se o cliente desistir do negócio ou em caso de inadimplência. Agora, o texto irá para o Senado antes da sanção presidencial.
A multa de metade das parcelas já pagas será aplicada à maioria dos imóveis construídos atualmente no Brasil que usam o chamado regime de afetação – o empreendimento é constituído legalmente separado da construtora, com CNPJ e contabilidade próprios. Esse sistema, que protege o patrimônio de cada projeto, foi adotado nos anos 2000 após problemas que afetaram milhares de clientes em efeito cascata, como na Encol. Caso o imóvel não esteja nesse regime, a multa máxima será de 25%.
Só haverá uma possibilidade de desistir do negócio e fugir da multa: caso o comprador encontre um novo interessado em assumir a dívida e o imóvel. O cliente substituto ficará com todos os direitos e obrigações do original e precisa ser aprovado pela construtora.
Se o cliente apenas devolver as chaves, será preciso ter paciência para reaver o dinheiro de volta. Caso o imóvel seja construído no regime de afetação, o cliente será reembolsado em uma única parcela até 30 dias após o habite-se, autorização para que os compradores possam ocupar o imóvel. Portanto, o cliente terá de esperar a conclusão do empreendimento. Caso o projeto não seja nesse regime, a devolução do dinheiro ocorrerá em até 180 dias após a assinatura do distrato.
Além da multa que poderá chegar a 50%, também serão descontados do consumidor a comissão de corretagem, impostos, taxas de condomínio e, caso a desistência ocorrer após o comprador começar a morar no local, poderá ser cobrado valor como uma espécie de aluguel a ser decidido pela Justiça.
Reação. Construtoras comemoraram. “Esse projeto é um avanço, pois garante os direitos do consumidor que paga seu imóvel em dia e vinha sendo prejudicado pela distrato”, avalia o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins. O setor argumenta que o grande volume de distratos acaba atrasando a conclusão dos imóveis – o que prejudica bons pagadores.
Para o presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz França, o projeto inibirá novos distratos. “A compra de imóvel será definitiva, como deve ser, e não especulativa.” Nos últimos 12 meses até fevereiro, foram registrados 33,3 mil distratos no País, ou 29,7% das vendas brutas no mesmo período, segundo dados da Abrainc.
Para Marcelo Tapai, advogado especialista em direito imobiliário e sócio do escritório Tapai Advogados, o projeto é “inconstitucional, pois retrocede direitos já adquiridos na Justiça pelos consumidores”.
O texto aprovado prevê o direito ao arrependimento caso a compra seja feita em estandes de venda ou fora da sede do incorporador. Nesse caso, o cliente poderá desistir sem qualquer ônus em até sete dias e receberá todos os valores pagos, inclusive taxa de corretagem.
Deputados da oposição tentaram aprovar emendas reduzindo a multa para 10%, sem sucesso. Opositores prometem agora mudar o porcentual da multa no Senado.
O texto prevê ainda que atraso de até 180 dias para a entrega do imóvel não gerará ônus para a construtora. Caso haja atraso superior a seis meses, a empresa terá de devolver todo o valor já pago pelo comprador e a multa prevista em contrato em até 60 dias. Caso o contrato não preveja multa, o comprador terá direito a indenização de 1% do valor já pago à incorporadora por cada mês de atraso.
Corretagem. Mais do que a proposta de multa de até 50% sobre o valor pago em caso de distrato, Bruno Magiezi, de 33 anos, lamenta que a legislação mantenha o desconto da taxa de corretagem – que o pegou de surpresa quando procurou reverter sua decisão.
Há dois anos e meio, ele comprou na planta um imóvel de R$ 257 mil em São Bernardo do Campo, onde mora com seus pais. Só que, há um ano, ele, que trabalhava como coordenador de produção, perdeu o emprego.
Rapidamente entrou em contato com a construtora. Porém, lhe foi dito que, dos R$ 18 mil que já havia pago, mais de R$ 16 mil eram só da taxa de corretagem – que normalmente varia de 3% a 6% do valor do contrato e é paga logo no início.
“A condição atual para quem desiste da compra já está difícil. Agora imagina se esse projeto, que favorece ainda mais as construtoras, for aprovado. Isso vai inibir muito a compra de imóveis.”
Fonte: Estadão
UGT - União Geral dos Trabalhadores