07/03/2016
Chegou a vez de o Twitter assoprar 10 velinhas. Criado em março de 2006, o microblog completa uma década cheio de prestígio entre pesquisadores como a rede que popularizou a informação. Ao dar voz a movimentos sociais e mídias alternativas, o pássaro azul foi protagonista de grandes manifestações como a Primavera Árabe, Occupy Wall Street e os protestos de junho de 2013 no Brasil. Apesar da relevância, tem cinco vezes menos usuários do que o Facebook. Enquanto o microblog fechou o último ano com 320 milhões de usuários, a criação de Mark Zuckerberg encerrou 2015 com 1,59 bilhão de pessoas na rede. A adesão inferior tem refletido na receita do negócio, que teve prejuízo líquido de US$ 521 milhões no ano passado.
O Twitter ainda enfrentou uma mudança de direção em 2015. Depois de seis anos como CEO da empresa, Dick Costolo anunciou que deixaria o cargo em junho. Além dos problemas econômicos, a rede enfrentava dificuldades por causa de conteúdos agressivos divulgados por usuários, como bullying, assédios e ameaças. Havia também perfis de militantes do Estado Islâmico. Em notas divulgadas em fevereiro pelo site The Verge, Costolo admitiu que a rede era ruim em lidar com os trolls (palavra em inglês que identifica usuários inconvenientes e provocadores) e perdia usuários por causa disso.
Com a saída do CEO, o cargo foi assumido interinamente pelo cofundador da empresa e autor do primeiro tuíte, Jack Dorsey, efetivado oficialmente para o posto em outubro. Meses depois, em janeiro, o empresário viu quatro vice-presidentes e um diretor deixarem a companhia. Em sua conta no microblog, Dorsey tuitou dizendo estar "eternamente grato" por tudo que os colegas deram ao Twitter. "Eles são absolutamente incríveis!", completou o CEO.
Informação como diferencial
Professora da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais (Midiars), Raquel Recuero explica que, no início, o Twitter tinha a característica da instantaneidade aliada à conversação. Com o surgimento de novas plataformas, como Facebook, Snapchat e WhatsApp, os usuários acabaram migrando o bate-papo para elas. Sobrou ao microblog a força da narração em tempo real, uma aposta que a própria rede ressaltou ao mudar o questionamento central de "o que você está fazendo?" para "o que está acontecendo?".
— O Twitter não está crescendo, mas tem uma questão muito forte que é o tipo de uso. O papel fundamental da rede continua sendo o informativo. É esse caráter que o mantém o vivo — avalia.
Devido aos algorítimos de filtragem, Raquel afirma que a informação no Facebook é propagada em bolhas. Ou seja: você só consegue recebê-la dos canais que assina e da própria rede.
— Observamos que o Facebook tem muitas bolhas de informação, onde dá a impressão de que todo mundo está falando a mesma coisa. Na verdade, quem está falando daquele assunto é apenas a sua rede. A tendência é de que, se for algo diferente, não apareça — explica.
Sem os filtros, o Twitter é mais amplo: tecnicamente, tudo aquilo que as pessoas publicam pode ser recebido. Por isso, a professora de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) Polyana Amorim define a plataforma como um espaço para quem quer participar de debates, onde os usuários se dividem entre os problematizadores e os brincalhões.
— Também temos debates no Facebook, onde entra o "textão", mas isso se perde entre outras coisas, como fotos de gatinho, paqueras e gifs. No Twitter, as discussões estão acessíveis em uma hashtag — afirma.
Embora o Facebook também tenha hashtags, só é possível encontrar as postagens públicas, o que restringe o acesso às informações. Doutora em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Gabriela Zago relembra uma estatística em que, no Facebook, 80% dos perfis eram privados, contra apenas 20% no microblog.
— O Twitter tem um caráter mais público. Tu consegues acompanhar o que todo mundo está dizendo, não só os teus amigos. Embora o Facebook tenha mais gente, o Twitter tem mais visibilidade do que está sendo dito — diz a especialista, que pesquisa o microblog desde 2007.
Ter os trending topics também é uma vantagem que o Twitter leva em relação às discussões. Por causa desse ranking, as pessoas podem conhecer os assuntos mais comentados, pesquisar sobre eles e participar dos debates. Um espaço livre para o ativismo.
Rede das manifestações
Nesses 10 anos, o Twitter teve papel importante no Brasil em relação a organizações sociais, protestos e transmissão de informações, segundo a professora Raquel. Um exemplo disso é o caso do jovem Rene Silva: em 2010, o morador do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, usou o Twitter para narrar a invasão policial no morro. Fundador do jornal Voz da Comunidade, ele viu o perfil da publicação passar de 180 seguidores para mais de 20 mil durante a cobertura (hoje, 219 mil acompanham as postagens), e a expressão #vozdacomunidade chegar aos trending topics do país. Três anos depois, nos protestos de junho, o Twitter também teve papel fundamental na disseminação das informações. À época, nasceu e ganhou fama o perfil da Mídia Ninja, atualmente com 45,9 mil seguidores.
— Enquanto caráter mobilizador, o Twitter teve papel decisivo para esse empoderamento dos movimentos sociais — relata a professora Janaina Calazans, coordenadora do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e autora de um artigo sobre Twitter e as manifestações. Já a professora Polyana Amorim define a plataforma como uma ferramenta de luta:
— É uma janela em que esses grupos têm o mesmo espaço que a mídia massiva, que opera com interesses econômicos. No caso das ocupações das escolas em São Paulo, talvez o governo não se posicionasse se não fossem tuítes que mostraram como a polícia estava sendo truculenta — avalia
Muitas dessas manifestações cresceram por causa das hashtags. Criadas para serem marcadoras de contexto, já que era difícil acompanhar as discussões no Twitter, elas foram apropriadas para outras funções pelos usuários. Raquel explica que hoje elas podem ser a própria mensagem — como o #primeiroassedio e o #meuamigosecreto, quando as mulheres se uniram para denunciar casos de assédio e machismo.
A entrada das marcas no Twitter facilitou o acesso dos clientes a elas. Se antes as pessoas tinham de telefonar para um Serviço de Atendimento do Consumidor (SAC) e esperar muito tempo na linha até conseguir uma resposta, agora basta um tuíte. Em 140 caracteres, o cliente discorre sobre seu problema, e a marca pode avaliar o caso mais rapidamente, evitando que os retuítes arruínem a imagem do produto. Com essa ferramenta, o público fez surgir nas empresas a necessidade de contratar profissionais para monitorar a marca no microblog. No próprio mercado, surgiram agências especializadas em marketing digital.
— O fato de a marca responder aos clientes ajuda a melhorar a imagem depois de uma reclamação. Isso criou a necessidade de contratar pessoas especializadas na gestão de crises nas redes sociais — afirma Gabriela.
UGT - União Geral dos Trabalhadores